07/2017

Tempo de leitura: 11 minutos

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Cinco anos após ser aprovado, Código Florestal enfrenta desafios para sua implementação

Foto: Divulgação

O Código Florestal completou cinco anos em 25 de maio. De lá para cá, a implementação da nova lei teve grandes avanços, como o sucesso do Cadastro Ambiental Rural (CAR), que já é uma das maiores bases de dados geoespaciais ambientais do mundo. No entanto, esbarrou também em obstáculos, como a morosidade na validação do CAR e na implementação do Programa de Regularização Ambiental (PRA) nos Estados, além das iniciativas do Congresso para prorrogar o prazo de cadastramento das propriedades. A Coalizão Brasil voltou a condenar a terceira e nova proposta de prorrogação do CAR, como parte de seu esforço para apoiar a implementação da lei.

Além disso, o debate sobre a constitucionalidade do Código voltou à cena. O Supremo Tribunal Federal (STF) está prestes a definir a data do julgamento das ações que podem invalidar a legislação.

Frederico Machado, especialista em políticas públicas da WWF e um dos líderes do Grupo de Trabalho do Código Florestal da Coalizão, explica o momento atual da lei e as ações que o movimento tem desenvolvido no tema.

Quais são os avanços que tivemos até agora na implementação do Código Florestal?

O principal avanço do Código Florestal é o número de cadastros que está na base do Sistema do Cadastro Ambiental Rural (Sicar). São mais de 4 milhões de cadastros e mais de 400 milhões de hectares na base. Já é, seguramente, uma das maiores bases de informação geoespacial ambiental do planeta. O sucesso do cadastramento é a grande conquista da agenda do Código Florestal até o momento.

E o principal obstáculo?

Os desafios estão agora na validação do CAR e na implementação do PRA. Essas agendas estão a cargo dos Estados.

Após o proprietário ou posseiro declarar no Sicar os dados da sua propriedade (o perímetro, as feições ambientais, a área consolidada, etc.), o ente competente precisa validar essas informações, que são auto declaratórias. Nesse caso, os governos estaduais, normalmente, as organizações estaduais de meio ambiente (OEMAs), precisam indicar se o cadastro corresponde à realidade ou se há inconsistências. Esse é o processo que se chama validação do CAR.

É fundamental que os Estados priorizem politicamente essas agendas (validação do CAR e implementação do PRA) para que elas possam ganhar a escala necessária. É importante também que os Estados garantam a estrutura operacional necessária, como equipamentos e pessoas. O Governo Federal deve dar todo apoio, ajudar a desenvolver os diferentes módulos, que é papel do Serviço Florestal Brasileiro que, junto com a Universidade Federal de Lavras, já vem fazendo.

A comunidade internacional deve também oferecer seu apoio com investimentos e criação de fundos específicos, fazendo com que essa agenda ganhe corpo. Em alguns Estados já existem ações de financiamento em curso, como o Fundo Amazônia e a recursos da cooperação alemã, mas é preciso intensificar isso, porque essas agendas demandam um volume de recursos substancial, dado o montante de informações a analisar e os milhões de hectares de passivo ambiental a serem regularizados.

Atualmente, alguns Estados estão puxando essas agendas. São nove Estados que estão no processo de validação do CAR, e a maior parte das unidades federativas já regulamentou o PRA. Mas, mais do que isso, é preciso implementar as ações em campo, o que só será possível com a criação de políticas de suporte aos proprietários e posseiros que têm passivos.

Por que a validação dos cadastros tem acontecido de forma lenta nos Estados?

Infelizmente, a realidade é que esta agenda ainda não ganhou uma centralidade política na maior parte dos Estados, que ainda não colocaram a validação do CAR como uma prioridade. Associado a isso, há também a crise financeira e a condição precária em que muitas das estruturas estaduais de meio ambiente se encontram. Ou seja, é uma questão política e também financeira.

O atraso na validação do CAR impede o avanço na implementação do Código Florestal?

O Grupo de Trabalho do Código Florestal (GT CF) entende que o atraso na validação não impede o início do PRA. É no PRA que residem os maiores ganhos ambientais da nova lei, por meio da compensação e da restauração. O fato de não haver a validação não impede o produtor de começar a regularização de seu imóvel rural. No entanto, o produtor fica numa situação de insegurança jurídica, porque ele não sabe se a informação declarada no sistema está ok ou se haverá algum questionamento por parte do órgão ambiental.

Portanto, na perspectiva do produtor fica essa dúvida. É também ruim para a consistência dos dados do Sicar, já que as informações permaneçam como auto declaratórias por muito tempo, carecendo de maior credibilidade. Por isso, a validação é tão importante.

Recentemente, uma nova proposta para prorrogação do prazo de registro no CAR avança no Congresso. Se aprovada, ela agravaria a credibilidade do Código Florestal?

Sim. A mensagem que está por traz é muito ruim, é a mensagem da falta de seriedade. Os produtores que já fizeram o seu cadastro são desrespeitados, ficando a certeza de que quem não cumpriu os prazos continua desfrutando dos mesmos benefícios.

Importante ressaltar que tal prorrogação não diz respeito ao prazo do cadastramento, afinal o cadastro estará sempre aberto. O que se quer com isso é a prorrogação dos benefícios que a lei trouxe, que apenas estão disponíveis aos proprietários que se cadastrarem até a data limite prevista na lei.

Entre os principais benefícios estão a chamada “escadinha” da Área de Preservação Permanente (quanto menor a propriedade, menor também a faixa ao longo dos cursos d’água que precisam ser conservados) e a anistia ao desmatamento ilegal anterior a 2008, que tem um regime jurídico específico no Código Florestal, com definição de áreas consolidadas. Somente quem se cadastrar no prazo da lei pode gozar esses benefícios.

Que riscos de imagem o Brasil corre quando um projeto como esse circula no Congresso?

Nas campanhas de marketing da produção agropecuária e de abertura de novos mercados que o Governo faz no exterior, o Código Florestal é apresentado como algo que está a todo vapor. Então, quando vem uma posposta como essa é uma contradição.

Esse tipo de movimento é muito ruim para a imagem que o país quer construir no exterior de credibilidade e seriedade em relação a questões de sustentabilidade na produção.

Após 5 anos da sanção do novo Código Florestal, a definição da data para o julgamento de quatro Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs), movidas pelo Ministério Público Federal (MPF), e uma Ação Declaratória de Constitucionalidade, movida pelo Partido Progressista, entrou na pauta do Supremo Tribunal Federal (STF). O que o julgamento do STF sobre a validade do Código Florestal pode significar para a agenda de implementação do Código?

Há certa insegurança jurídica pelo fato do Código Florestal estar sub judice, que é o status em que ele se encontra agora, pelo menos até o julgamento acontecer.
Isso faz com que alguns grupos ligados à produção rural sintam-se inseguros de dar um passo mais assertivo na regularização de suas propriedades, com investimentos em restauração ou compensação.

Se a decisão do STF não sair com brevidade, poderá haver uma desaceleração na implementação de instrumentos fundamentais do Código, justo em um momento em que precisamos acelerar. O GT CF defende que o julgamento aconteça o mais rápido possível. Vemos com bons olhos o fato do tema ter entrado na pauta do STF e esperamos que o julgamento ocorra nas próximas semanas.

Em relação ao mérito das ADIs, não há consenso no grupo. Uma parte entende que o ideal seria não mexer no Código Florestal, pois qualquer modificação pode fazer com que a gente dê passos para trás, podendo inclusive inviabilizar o Código ou, ainda, fazer com que o tema volte ao debate no Congresso e resulte em uma lei pior. Esse é o contexto de quem defende a não alteração, ou seja, que essas ADIs não sejam aceitas. Por outro lado, há outros que entendem que houve muito retrocesso com a aprovação do Código Florestal, que foram perdidos direitos ambientais que já estavam consolidados e, por isso, alguns pontos deveriam ser revertidos.

Quais são as principais ações que o GT tem focado, tendo em vista a implementação do Código Florestal?

Estamos focados no processo de validação do CAR, na implementação do PRA e das Cotas de Reserva Ambiental (CRAs), na transparência das informações e no impedimento de questões como a prorrogação do CAR.

Temos um grande protagonismo em relação às CRAs, que consiste em uma das possibilidades de compensação do passivo ambiental. Em comparação com as alternativas de comprar ou arrendar uma terra para a compensação, a CRA poderá ser uma solução com menor custo e maior simplicidade operacional.

A CRA precisa ser regulamentada para que um mercado específico desse título seja estruturado, estimulando e acelerando a compensação dos passivos ambientais dos imóveis rurais brasileiros. Estamos trabalhando com o Serviço Florestal Brasileiro (SFB), com o Observatório do Código Florestal e outros parceiros para regulamentar esse instrumento até o fim desse ano.

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