04/2021

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Coalizão Brasil lança Programa de P&D em Silvicultura de Espécies Nativas

Coalizão Brasil lançou, com apoio do WRI Brasil e outras instituições, o Programa de Pesquisa e Desenvolvimento em Silvicultura de Espécies Nativas (PP&D-SEN), que tem como objetivo impulsionar pesquisa e tecnologia necessárias para tornar essa atividade um setor tão significativo quanto outras áreas da agropecuária.

Em webinar realizado no dia 13 de abril, foram apresentados a estrutura, os objetivos e a governança do programa, além de um debate sobre o potencial da silvicultura de nativas e as oportunidades para o Brasil na Década da Restauração da ONU.

O Programa tem por objetivo promover o desenvolvimento científico e tecnológico necessário ao estabelecimento da silvicultura de espécies nativas no Brasil em escala comparável à dos principais setores agroindustriais do país. Ao longo de 15 anos, o PP&D-SEN prevê a implementação de uma rede de 20 sítios de estudo de na Amazônia e na Mata Atlântica, com espécies já mapeadas segundo seu potencial econômico.

O PP&D-SEN tem potencial de contribuição no enfrentamento às mudanças climáticas, para a recuperação de ecossistemas saudáveis e para a geração de renda e empregos. O programa soma-se a outras iniciativas da Coalizão, como os recém-lançados GT de Nativas, em parceria com o governo do Espírito Santo, e o Observatório da Restauração e Reflorestamento.


Potencial econômico e ambiental das espécies nativas

“A entrega deste programa inaugura uma etapa em que o sonho da silvicultura tropical, com espécies nativas de nossas florestas, pode se tornar realidade”, afirmou Rachel Biderman, cofacilitadora da Coalizão e vice-presidente sênior para as Américas da Conservação Internacional (CI), na abertura do evento.

Em seguida, Fatima Piña-Rodrigues, da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), explicou o contexto e os esforços iniciais que levaram à criação do PP&D-SEN. Segundo ela, atualmente as florestas plantadas respondem por 1,3% do PIB do país, sendo que boa parte delas (72,4%) são de eucalipto. O cultivo dessa espécie, assim como cana-de-açúcar, soja e milho, apresentou um aumento expressivo de produtividade em poucas décadas, devido a investimentos em pesquisa e desenvolvimento, enquanto o mesmo não ocorreu com o plantio de florestas nativas.

O Brasil hoje atende, por exemplo, menos de 10% da demanda global de madeira tropical. O país, no entanto, tem 50 milhões de hectares de pastagens degradadas, com baixa aptidão agrícola, que poderiam ser usadas para o plantio de espécies arbóreas nativas. Com essas áreas, seria possível suprir 50% da demanda global de madeira tropical até 2050, afirmou a pesquisadora. “É o momento de pensar em como atender essa expectativa de aumento de demanda”, disse. Além disso, compromissos internacionais, como o Acordo de Paris e o Desafio de Bonn, e a necessidade de enfrentar as mudanças climáticas e restaurar ecossistemas demandam o plantio de espécies florestais.

Diferentes organizações e iniciativas buscaram entender como esse cenário poderia ser alterado e chegou-se a um escopo de 30 espécies da Mata Atlântica e da Amazônia com potencial econômico. A avaliação sobre retorno financeiro da atividade também se mostrou animadora: para cada um dólar investido em P&D de árvores nativas, o retorno será de US$ 2,39. É nesse contexto que surge o PP&D-SEN.

Na sequência, Daniel Piotto, da Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB), explicou os principais pontos do programa, como governança, estrutura, áreas e prioridades. Os três pilares são: pesquisa, capacitação e comunicação. A pesquisa se subdivide em temas como pesquisa, paisagem e dimensões humanas. A capacitação envolverá frentes como pós-graduação e cursos de extensão. “Já a comunicação é um pilar importante porque é preciso trabalhar a imagem do programa e mostrar que é uma atividade inovadora”, afirmou Piotto.

Com duração de 15 anos, o programa tem como uma de suas prioridades a implantação de uma rede de 20 sítios de pesquisas na Mata Atlântica e na Amazônia. Cada local terá 15 hectares para desenvolver estudos com até 10 espécies. Os primeiros sítios definidos estão no estado do Espírito Santo, Bahia, Pará e São Paulo.

Outros pontos prioritários são a estruturação de um banco de dados e a padronização do delineamento amostral de experimentos. O programa está agora buscando recursos, em instituições como bancos de desenvolvimento, fundações de amparo à pesquisa e financiadores privados.

Debate sobre o potencial da silvicultura de nativas

Após a apresentação do PP&D-SEN, houve um debate com Renato Casagrande, governador do Espírito Santo, Luciano Verdade, do Centro de Energia Nuclear na Agricultura (CENA) da Esalq/USP, Milton Kanashiro, da Embrapa Amazônia Oriental, e Patrícia Daros, do Fundo Vale. A mediação foi de Miguel Calmon, do WRI Brasil.

Casagrande destacou os projetos privados e públicos de restauração e pesquisa de espécies nativas que existem no estado do Espírito Santo, que abrigará um dos sítios do programa. “Termos sido selecionados pela Coalizão para ser um polo de espécies nativas cumpre um importante papel dentro da visão que temos sobre o modelo de desenvolvimento de queremos”, afirmou. O governador disse ainda que o estado está fazendo mudanças na legislação, com o acompanhamento da Coalizão, para que haja menos burocracia e mais segurança jurídica para o agricultor que desejar investir em espécies nativas.

Patricia Daros falou sobre o papel do setor privado no apoio a essa agenda, e apresentou o trabalho que a Vale tem feito desde 2019, quando lançou uma meta florestal de recuperar e/ou proteger 500 mil hectares de áreas além de suas fronteiras, e abordou as pesquisas que têm sido feitas com espécies madeireiras e não madeireiras, como cacau e jaborandi. Para ela, “as empresas buscam ser carbono neutras, e a floresta tem papel fundamental nisso”, afirmou. A Vale também está investindo em startups florestais e avaliando atividades como sistemas agroflorestais e silvipastoris, acrescentou.

Para Luciano Verdade, o programa “pode nos levar a seguir os passos de outros setores que se desenvolveram. Ele permite que se possa pensar grande”. A silvicultura de espécies nativas, além de fornecer uma alternativa econômica, promove sequestro de carbono e mitigação de mudanças climáticas e tem, portanto, uma grande dimensão socioeconômica não apenas para o país, mas globalmente, afirmou.

A cofacilitadora da Coalizão, Rachel Biderman, destacou que o programa é resultado da soma de esforços e iniciativas de diversos atores, por exemplo, a academia. “Há conhecimento requintado sobre florestas pelo Brasil inteiro, um diferencial que pode atrair investimentos”, afirmou. Biderman também destacou o papel da sociedade civil, de empresas e de governos, bem como dos produtores rurais, nas iniciativas de pesquisa em silvicultura de espécies nativas.

Por fim, Milton Kanashiro, da Embrapa, elencou os três desafios principais da silvicultura de espécies nativas no país: é preciso conhecer e entender a ecologia de crescimento e reprodução das espécies, para promover o manejo adequado; os investimentos que existem em P&D são pequenos e estão restritos a instituições governamentais, à exceção de algumas iniciativas privadas; as escolas florestais negligenciaram as nativas por muito tempo. Por isso, disse estar contente com o programa, por ser uma “iniciativa intersetorial em prol das espécies nativas”.


Lançamento de livro e curso de pós-graduação

Ao final do webinar, foram anunciadas duas iniciativas ligadas à área de capacitação do programa. Fátima Piña-Rodrigueis divulgou o lançamento do livro Silvicultura Tropical – o potencial madeireiro e não madeireiro das espécies tropicais, coordenado por ela e por José Mauro Santana da Silva, também da UFSCar.

A outra iniciativa, apresentada por Daniel Piotto, foi a criação de um curso de pós-graduação lato sensu, lançado em parceria entre a UFSB e a UFSCar, previsto para iniciar em 2022.

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