07/2020

Tempo de leitura: 18 minutos

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Entrevista: Fóruns de Diálogo são a força por trás das conquistas da Coalizão Brasil

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Foto: Clóvis Fabiano

Os Fóruns de Diálogo são os principais espaços de debate e troca de informações da Coalizão Brasil, onde se discutem os temas relacionados à agenda do movimento. Os quatro fóruns – Agropecuária e SilviculturaDesmatamentoFloresta Nativa e Políticas Públicas e Instrumentos Econômicos –, além de 14 Forças-Tarefa criadas dentro deles, contribuem com pontos de vista e informações para produzir, juntos, documentos, notas técnicas e dados que subsidiam as ações de advocacy e a estratégia geral do movimento, que é definida e aprovada pelo Grupo Estratégico (GE). Os fóruns foram os grandes responsáveis, por exemplo, pela elaboração do documento Visão 2030-2050 do movimento, em 2018.

Cabe à coordenadora de Relações Institucionais da Coalizão Brasil, Laura Lamonica, junto com os facilitadores e a equipe da Coordenação Executiva, gerir os fóruns e as forças-tarefa e manter o direcionamento dos debates e esforços para a implementação das propostas principais do movimento.

Bióloga por formação e mestre em sustentabilidade com foco em avaliação de impacto ambiental, Laura explica, nesta entrevista, o papel fundamental dos Fóruns de Diálogo e Forças-Tarefa nas conquistas e avanços do movimento e o desafio de criar ambientes seguros e de confiança para que o debate seja encorajado, com resultados robustos. “Há uma força maior quando você apresenta ao governo uma proposta que já foi chancelada por diferentes setores, que tem apoio do setor privado, do setor financeiro, da sociedade civil e da academia.”

Veja, a seguir, os principais trechos da entrevista. Depois, confira as atividades dos fóruns na Plataforma do Plano de Ação.

O que são os Fóruns de Diálogo da Coalizão? Qual o papel deles dentro do movimento?

Como o próprio nome diz, os fóruns são um espaço para a ampla discussão e debate sobre os diversos temas da agenda do movimento. É um ambiente de troca, de alinhamento e de oxigenação entre os membros e parceiros da Coalizão. A primeira missão dos Fóruns, quando foram criados, de 2017 para 2018, foi a construção de uma visão de longo prazo para a Coalizão, que tem como horizontes os anos de 2030 e 2050. Esses espaços de ampla participação permitiram que esse documento fosse produzido por mais de 200 pessoas, que representavam mais de 100 organizações diferentes.

Como os fóruns têm atuado desde a elaboração da Visão de Futuro e como as forças-tarefa se inserem nos esforços de implementar as propostas dessa visão?

Os fóruns têm pautado sua atuação em planejar e executar diversas ações para tornar esse conjunto de propostas – a visão de longo prazo e outros documentos que embasam a coesão do movimento – em realidade. No início de 2019, os profissionais e especialistas que lideram esses fóruns se reuniram junto ao Grupo Estratégico (GE) e ao Grupo Executivo (GX), que são outras instâncias de governança da Coalizão, e definiram seis ações prioritárias para 2019 e 2020. Essas ações são transversais aos temas dos fóruns e embasam a atuação desses grupos. Já as forças-tarefa (FTs) são grupos menores e transitórios, criados no âmbito dos fóruns, que endereçam temas mais específicos no curto e médio prazo, também na direção da implementação dessas ações prioritárias. Elas geralmente são frutos do encaminhamento das conversas dos próprios fóruns ou de outras instâncias de governança da Coalizão.

Quando e como os fóruns e as forças-tarefa se reúnem para debater os temas de que estão tratando?

As reuniões gerais dos Fóruns de Diálogo acontecem três vezes ao ano. Já as forças-tarefa têm agendas próprias: se reúnem com mais frequência, promovem eventos, fazem reuniões com atores externos à Coalizão e com o governo e participam de audiências públicas, entre outras iniciativas. Elas têm autonomia para isso, e tudo só é possível porque contamos com um grupo de lideranças extremamente engajado no trabalho dos fóruns e das forças-tarefa. Esses líderes são especialistas que representam membros e organizações parceiras da Coalizão e são os verdadeiros responsáveis por coordenar essas ações. Também são os nossos porta-vozes nesses temas.

Quem pode participar dos fóruns e das forças-tarefa?

Temos um formulário de inscrições para os Fóruns de Diálogo. Os interessados podem se inscrever e passam então a integrar as mailing lists dos fóruns de seu interesse. Qualquer pessoa, seja membro ou não, pode receber comunicados, convites para as reuniões gerais e as atas após as reuniões.
Já para as forças-tarefa, que são grupos transitórios e mais restritos, normalmente identificamos um conjunto de interessados que poderiam conduzir aquela agenda específica. Por exemplo, quando foi criada a FT de Rastreabilidade da Carne, logo vimos que precisávamos contar com representantes do setor da carne e do terceiro setor. Então convidamos esses atores, de forma um pouco mais direcionada, pois manter esses grupos menores é importante para dar a agilidade necessária ao avanço de cada tema.

Considerando que há temas sensíveis, mas que são de interesse dentro da Coalizão, como se faz para chegar a uma posição aceita por todos?

Acho que o nosso maior desafio, mas que também é a maior força da Coalizão, vem da diversidade de vozes, que a gente tenta contemplar ao máximo. Existem alguns pontos importantes para conseguir resultados nesse sentido. Primeiro, é tentar sempre promover um ambiente de confiança e respeito, para que os diversos participantes coloquem suas posições, mesmo que sejam divergentes a princípio. Além disso, contamos com muitos especialistas nos temas abordados e sempre prezamos pela apresentação de dados científicos e informações de qualidade. Isso nos ajuda a orientar melhor o debate, para que não vire uma guerra de ideologias ou opiniões. É uma conversa sempre pautada em informações de qualidade. Esta é a base para que a gente comece a instigar as pessoas a praticar a escuta e construir as pontes de convergência. Essa riqueza de posições é o real diferencial do trabalho da Coalizão. As ações e posicionamentos são sempre baseados em consenso ou consentimento entre esses diferentes setores que temos no movimento.

Acontecem impasses? Como são resolvidos, para que se chegue a um ponto em comum?

Às vezes acontece de alguns assuntos não avançarem, quando não é possível achar uma convergência minimamente significativa. Isso é natural em um movimento como a Coalizão. É importante aceitar essas limitações. A nossa posição, na Coordenação Executiva, é prezar por isso, ajudar os membros a identificar essas limitações. Não se trata de uma gestão de conflito, mas de prezar por esse ambiente de confiança e respeito, para que as pessoas possam se expressar.

Uma premissa importante para que tudo isso aconteça da forma mais saudável possível é o respeito que a Coalizão tem pela atuação individual dos seus membros e parceiros. Se surge algum assunto para o qual não encontramos meios de construir uma convergência internamente, o movimento respeita plenamente que as organizações se posicionem individualmente. Essa é uma premissa fundamental.

Pode acontecer a suspensão ou interrupção de um debate em torno de um tema, quando não se chega a um consenso?

Pode acontecer, mas sempre tentamos construir um caminho do meio. Um exemplo é o tema do licenciamento ambiental. Não existe ainda uma convergência na Coalizão sobre o Projeto de Lei de Licenciamento Ambiental, mas existe concordância no que entendemos como diretrizes gerais para licenciamento ambiental no Brasil. Então temos um documento da Coalizão que expressa essas diretrizes gerais, que é o nosso ponto de consenso.

O exercício de fazer a Visão 2030-2050 foi nesse sentido. Em 2017 a polarização política já estava acentuada e pensar na convergência em ações de curto prazo se tornou mais desafiador. Por isso, em 2018, pensamos: “E se a gente olhar lá para frente, para 2050, o que será que vai acontecer?” Vimos que todo mundo pensava igual no longo prazo: todos querem acabar com o desmatamento, todos querem aumentar a produção de alimentos. Então fizemos essa gestão, de mudar um pouco o rumo e olhar lá para o futuro para retomar a coesão do movimento.

Qual a força que têm as decisões tomadas em conjunto, por diferentes atores, dentro dos fóruns?

Tudo que é construído pela Coalizão e, especialmente, pelos fóruns tem esse diferencial. Há uma força maior quando você apresenta ao governo uma proposta que já foi chancelada por diferentes setores, que tem apoio do setor privado, do setor financeiro, da sociedade civil e da academia. Dessa forma, nós buscamos fazer com que os avanços na agenda de clima, florestas e agricultura aconteçam de forma mais rápida, pois a concertação entre os diferentes setores já foi feita, basta implementar as ações.

Como as ações e agenda dos fóruns e forças-tarefa se relacionam com as diretrizes gerais da Coalizão Brasil?

O Grupo Estratégico (GE) é a instância responsável por apontar as diretrizes gerais, fazer a leitura do contexto político, ver onde é mais estratégico para o movimento colocar a energia. Essas diretrizes são levadas aos Fóruns de Diálogo para fazer ajustes de rota, acelerar algumas ações e reduzir a velocidade de outras. Os responsáveis por fazer esse fluxo entre o GE e os Fóruns é a Coordenação Executiva. Também atualizamos o GE sobre o que os fóruns estão fazendo. Já o Grupo Executivo (GX) ajuda mais no dia a dia e na execução dessas diretrizes. Em geral, os membros do GX também são líderes dos Fóruns, para cada fórum ter esse fluxo de informação sempre constante.

Vale lembrar que as lideranças dos fóruns fazem imersões semestrais, sempre no início e no meio do ano. A primeira é para fazer o planejamento para o ano, e a segunda é para fazer um balanço do que aconteceu no primeiro semestre e quais os ajustes que precisam ser feitos até o fim do ano. O GX e o GE são convidados a participar nesses momentos.

Quais foram as principais conquistas desses grupos temáticos?

Temos diversas conquistas, algumas um pouco mais fáceis de mensurar do que outras. A primeira grande entrega dos fóruns foi a produção da visão de longo prazo, resultado de consenso entre mais de 200 pessoas envolvidas. Desde então, os fóruns também promoveram um engajamento crescente de seus membros e outros interessados. Já produziram diversos materiais com contribuições relevantes para a agenda da Coalizão, como regularização fundiária, pagamento por serviços ambientais, restauração e reflorestamento e mercado de carbono. Fizemos, por exemplo, documentos com subsídios importantes para os dois últimos Planos Safra, com foco na valorização da agricultura de baixo carbono e também para promover um maior alinhamento com o Código Florestal. Inclusive, sobre isso, tivemos avanços interessantes no Plano Safra deste ano, no que diz respeito ao Programa ABC, e também um indicador no Manual do Crédito Rural de maior alinhamento ao Código Florestal, que agora permite um aumento do limite de crédito em até 10% para aqueles produtores que tiverem o Cadastro Ambiental Rural (CAR) validado.

A grande conquista dos fóruns nestes últimos anos foi manter essa energia e qualidade nos debates e nas contribuições para agendas tão relevantes para o uso da terra. (Veja as principais conquistas e avanços dos Fóruns de Diálogo no final desta entrevista).

Com tanta coisa acontecendo, como você e a Coordenação Executiva fazem para acompanhar tudo de perto?

É algo que estamos aprendendo a fazer. Inicialmente eram quatro fóruns e uma força-tarefa aqui e outra ali. E eis que hoje temos, além dos quatro fóruns, 14 forças-tarefa funcionando. Isso não estava previsto. Mas é um retrato da complexidade da agenda de clima, florestas e agricultura e do tanto de coisa que ainda precisa ser feita.

A equipe toda acaba ajudando com os Fóruns, porque é de onde sai grande parte da nossa produção de conteúdo e ideias. Boa parte do nosso tempo é dedicado à gestão, sistematização das informações, organização das atas, dos documentos que são produzidos e sua divulgação.

Neste momento atípico, em que vivemos a crise da pandemia da Covid-19, a dinâmica dos fóruns mudou?

A pandemia impactou a todos. Mas uma consequência inesperada – até positiva, de certa forma – foi um certo aumento da participação das pessoas nas reuniões on-line, talvez por elas estarem mais em home office, com maior flexibilidade das agendas. Por exemplo, as reuniões dos fóruns tiveram aumento de 40% no número de pessoas e de quase 60% no número de organizações participantes. A média de participação das reuniões gerais em março foi de 46 pessoas por encontro e, em junho, foi de 65. Então tivemos essa surpresa, e estamos pensando como aproveitar essa disposição e engajamento dos membros para construir ações que sejam bastante efetivas. Tivemos também um recorde de participação na Primeira Plenária de 2020, que foi feita pela primeira vez nesse formato 100% on-line.

Também sentimos, recentemente, uma maior aproximação de representantes governamentais, em especial do pessoal mais técnico de ministérios e instituições do governo e de alguns projetos municipais. Eles têm participado ativamente das reuniões dos fóruns. Notamos ainda uma aproximação do setor financeiro, que está mais atento ao papel da Coalizão. Acho que faz parte desse contexto todo que estamos vivendo.

Por outro lado, alguns temas, que estavam avançando mais rapidamente, reduziram a velocidade. Por exemplo, o Projeto Lei de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA), que tinha tudo para andar, ficou paralisado no Senado, porque é das agendas que não são consideradas prioritárias na pandemia, e estou plenamente de acordo. Então isso acabou comprometendo alguns avanços com o governo, apesar da FT PSA da Coalizão ter seguido seu planejamento de debates internos e reuniões sobre o tema.


Veja, a seguir, as principais conquistas dos Fóruns de Diálogo e Forças-Tarefa da Coalizão, desde 2019:

• Nota técnica para aprimorar o Projeto de Lei de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA), que atualmente tramita no Congresso;

• Análises detalhadas sobre os diversos relatórios da Medida Provisória (MP) 910, mais recentemente PL 2633;

• Documentos com subsídios importantes para os dois últimos Planos Safra, com foco em valorizar a agricultura de baixo carbono e tentar promover um maior alinhamento com o Código Florestal;

• Inclusão, no Manual do Crédito Rural, de um indicador de maior alinhamento ao Código Florestal, que agora permite um aumento do limite de crédito em até 10% para aqueles produtores que tiverem o Cadastro Ambiental Rural (CAR) validado;

• Publicação de um white paper sobre o potencial desses mercados e dos pagamentos por resultados;

• Os fóruns também participaram de diversas audiências públicas e subsidiaram a coordenação e os facilitadores da Coalizão para reuniões com o governo no que diz respeito a dados de desmatamento, ilegalidade, grilagem de terras, florestas públicas não destinadas;

• Realização de uma oficina com especialistas em restauração para conversar sobre monitoramento dessas ações em relação a paisagem. A partir desse debate, uma força-tarefa começou a trabalhar intensamente para desenvolver uma plataforma nacional de monitoramento da restauração e do reflorestamento, que deve ser lançada pela Coalizão no início do ano que vem;

• Lançamento de estudo sobre as prioridades e lacunas de pesquisa e desenvolvimento em silvicultura de espécies nativas, que hoje está sendo discutido junto com outros gargalos da silvicultura de nativas, em uma força-tarefa específica;

• Contribuições para a revisão do Plano ABC e da Política Nacional de Mudança do Clima, em 2019.

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