09/2021

Tempo de leitura: 12 minutos

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Entrevista: Nova Força-Tarefa alinhará discussões sobre o Código Florestal

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Em setembro, a Coalizão Brasil ganha uma Força-Tarefa (FT) dedicada ao Código Florestal. Um dos principais propósitos do novo grupo é promover o alinhamento das muitas discussões envolvendo o Código que acontecem nas diferentes FTs e Fóruns de Diálogo do movimento.

O Código Florestal é um dos principais elementos norteadores de muitas das propostas da Coalizão. Além de promover a sinergia de debates, a FT também terá como objetivos induzir discussões sobre o tema entre os grupos internos, quando necessário, e fazer a ponte com atores externos estratégicos para essa agenda.

Beto Mesquita, diretor de Florestas e Políticas Públicas da BVRio e membro do Grupo Estratégico (GE) e colíder do Fórum de Diálogo Políticas Públicas e Instrumentos Econômicos da Coalizão, explica, nesta entrevista, os principais motivos para a criação da FT e como será a sua atuação. “A Coalizão está sempre se referenciando em diferentes dispositivos previstos no Código Florestal, que é, portanto, o seu principal alicerce regulatório. Não é o único, mas é sem dúvida o principal”, afirma.

A primeira reunião da nova FT deve ocorrer ainda neste mês.

Leia a seguir os principais trechos da conversa.

Qual a posição da Coalizão Brasil em relação ao Código Florestal e qual o seu papel para a agenda do movimento?

Gostaria de começar falando sobre a própria natureza da Coalizão e como ela tem a ver com o atual Código Florestal. A turma do ruralismo mais conservador e o pessoal mais conservador do ambientalismo consideram que o país perde com o Código Florestal. Uns porque acham que é restritivo ou proibitivo demais, e outros por pensarem que ele é flexível e permissivo demais. Por que falo isso com relação à Coalizão? Quando se cria uma coalizão que junta ambientalistas, ruralistas, representantes do agronegócio e pesquisadores, é necessário criar um equilíbrio em suas posições. Não se pode ir para um extremo ou outro. Nesse aspecto, diria que o Código Florestal é uma lei que trouxe esse tipo de equilíbrio, porque, ainda que não seja visto como perfeito pelos setores por diferentes motivos, todos reconhecem que ele é necessário.

Quando se olha os documentos iniciais da Coalizão, vê-se que o movimento nasceu da percepção de que precisamos implementar o Código Florestal. A origem da Coalizão foi elaborar uma boa proposta de país para a Conferência do Clima de Paris (COP 21, em 2015), mas esse foi um pretexto. Precisávamos colocar o uso do solo e florestas no cerne da discussão climática, mostrando o modelo de desenvolvimento que queremos para o país. Então, a Coalizão está sempre se referenciando em diferentes dispositivos previstos no Código Florestal, que é, portanto, o seu principal alicerce regulatório. Não é o único, mas sem dúvida é o principal.

A agenda de clima na Coalizão é relacionada ao uso do solo. E isso tem tudo a ver com o Código Florestal, a lei basilar que determina as relações do uso do solo no país. Existe uma conexão intrínseca na origem e nas características. O Código Florestal é um equilíbrio entre diferentes visões, e a Coalizão também precisa se posicionar dentro desse equilíbrio.

Como surgiu a ideia de criar uma Força-Tarefa dedicada ao Código Florestal?

A Coalizão não pode atuar apenas na reação, mas também na proposição, e é aí que entra a ideia desta FT. Qual foi a percepção? Se o Código tem tanto a ver com a própria Coalizão, se no “Livro Verde” há uma série de propostas explícitas sobre essa lei ou baseadas nela, como está a agenda proativa, positiva, da Coalizão com relação a ela? Um exemplo recente e bacana dessa agenda, e que poucos relacionam ao Código, foi a aprovação da lei que instaura a Política Nacional de PSA (Pagamento por Serviços Ambientais). O Artigo 41 do Código diz que proteger e recuperar florestas tem que ser passível de algum tipo de compensação, seja ela monetária, fiduciária ou creditícia. Quando a Coalizão resolveu tratar desse assunto, num primeiro momento, pensou-se em propor uma regulamentação do Artigo 41. Mas é muita coisa, são vários assuntos. Então escolhemos um deles, em que conseguiríamos avançar. E assim fomos para o PSA, porque já havia 13 projetos de lei (PLs) sobre esse tema, o mais antigo com quase dez anos de tramitação, e o assunto não andava.

Esse foi um momento interessante, em que a Coalizão mostrou que, sendo proativa, consegue destravar processos complexos. Em um ano, algo que estava tramitando há uma década virou um PL só, com relatoria favorável. Foi aprovado na Câmara com muitos dos apontamentos da Coalizão, e o movimento rapidamente foi para a articulação junto ao Senado. O Senado aprovou as modificações e negociou com a Câmara para não alterá-las. E aí veio a sanção presidencial, com vetos que desmontariam a proposta, mas a Coalizão conseguiu articular, dialogar com os parlamentares para derrubar todos os que eram mais críticos.

Então, com relação ao Código, não podemos ficar na posição de esperar um deputado apresentar um PL estapafúrdio para então reagir. Precisamos avançar efetivamente na implementação do Código Florestal.

Ao olhar os Fóruns de Diálogo e as FTs, ficou claro que, em vários deles, havia assuntos relacionados ao Código. Às vezes, em uma FT, o assunto não era priorizado ou ia por um caminho diferente daquele tomado em outra FT, mesmo sendo um assunto parecido. Isso acaba chegando ao GE (Grupo Estratégico) de duas maneiras ruins: picotado, sem previsibilidade, ou com risco de vir uma proposta num sentido e outra inversa. Se o GE se posicionasse baseado em uma delas, sem saber o que vem do outro, seria péssimo para a Coalizão.

Por isso, o papel desta Força-Tarefa é diferente. É estimular e deslanchar os temas relacionados ao Código debatidos em outros grupos. Não é uma FT para propor agenda ou construir propostas. Ela não vai se apropriar dos assuntos que estão sendo discutidos em outros fóruns sobre o Código. Não se trata de uma centralização das discussões. Muito pelo contrário. É fundamental que as FTs que estão tratando de temas relacionados a essa lei continuem a fazê-lo.

Como será a composição desta FT? Ela fará uma compilação sobre propostas relacionadas ao Código Florestal discutidas por outros grupos da Coalizão?

Não é uma FT aberta, como as outras. Vai ser composta apenas por líderes de fóruns de diálogo e de FTs. É sobre um assunto específico, que, pela sua relevância e abrangência e pela maneira como é intrínseca à agenda da Coalizão, merece um tratamento especial. A ideia é que sirva principalmente para estimular que essas agendas aconteçam nas FTs, manter a temperatura aquecida, garantir sinergia entre as diferentes propostas. Eventualmente exercerá um papel de curadoria. Só que isso será feito pelos próprios líderes.

Um outro propósito desta FT é olhar para instituições, pessoas relevantes e pesquisadores que não são membros da Coalizão, mas que são essenciais nessa discussão. No caso do Código Florestal, um dos principais é o Observatório do Código Florestal, que já foi parceiro da Coalizão em campanhas ou ações de advocacy no Congresso para defender o Código. Então a ideia é criar, a partir dessa FT, uma ponte de cooperação com outros grupos que estão na mesma agenda.

Todos os líderes de fóruns e das FTs foram convidados para integrar este novo espaço. Acho que vai ser a melhor maneira de dar mais evidência e eficiência nos posicionamentos da Coalizão nos assuntos relativos ao Código, principalmente na agenda proativa. Se necessário, na reativa, também. Até porque, sempre que a Coalizão reage, ela faz isso baseada em evidências que busca nas discussões que estão acontecendo nos fóruns. E esse processo poderá ser mais rápido com esta FT.

Por que criar essa Força-Tarefa agora? Há uma urgência no momento?

Na minha visão, há alguns fatores, mas que não têm a ver com urgência ou um episódio específico. Mesmo porque o Código Florestal é urgente desde 2012. Acho que o primeiro fator é que, neste momento, estamos passando por um debate, ainda restrito ao GE e ao GX (Grupo Executivo), sobre a governança da Coalizão. E é natural que, ao discutir governança, comecemos a prestar atenção em como ela está funcionando. No caso do Código, ficou evidente que, se a compartimentalização em Fóruns e FTs ajuda a fazer muitas coisas ao mesmo tempo, é fundamental ter isso mais bem organizado.

A segunda razão é porque já houve episódios em que duas FTs ou dois Fóruns estavam tratando de assuntos similares sobre o Código e, na hora de a Coalizão consolidar um posicionamento, alguém lembrava que uma posição estava contradizendo outra que também era discutida. Na minha percepção, essas são as razões pelas quais criamos a FT agora.

Esta FT será sempre uma alinhadora, uma orientadora? Na prática, como vai se relacionar com as outras FTs e com os Fóruns?

Ela também pode induzir algum processo de discussão nas outras FTs, mas nos assuntos restritos ao Código Florestal. Imagino ainda que duas situações podem acontecer, extrapolando um pouco o propósito inicial. Uma delas é: reúne muitas pessoas com discussão acumulada e, de repente, surge algo novo ali ou uma proposta de procedimento. Outro fator que pode acontecer é alguém perceber, nas reuniões, que há sinergia com outros temas alheios ao Código. Isso pode vir a ajudar. A ideia é experimentar esse modelo e ver como funciona.

Em resumo, poderia dizer quais são os três propósitos da FT?

O primeiro é integrar, garantir que os assuntos que tenham relação direta ou indireta com o Código tenham sinergia, no tempo e na proposição, para que não haja propostas contraditórias entre as FTs. Também é induzir: se for percebido um assunto mais urgente, vamos sugerir que seja priorizado. Tem ali uma troca, uma via de mão dupla. O segundo propósito é compilar e endereçar propostas e demandas para posicionamentos ao GE. E o terceiro é a conexão para fora da Coalizão, ser uma ponte de articulação com atores externos.

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