08/2021

Tempo de leitura: 8 minutos

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Entrevista: Plano Safra traz mudanças para o Programa ABC para 21/22

No final de junho, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) lançou o Plano Safra 2021/2022. O novo plano incorpora algumas das contribuições que a Coalizão Brasil havia enviado poucos meses antes por meio da FT Finanças Verdes. O documento da FT para o Plano Safra, na forma de notas técnicas, trazia propostas relacionadas, em especial, ao Programa para Redução da Emissão de Gases de Efeito Estufa na Agricultura (Programa ABC).


Nesta entrevista, Leila Harfuch, gerente geral da Agroicone e uma das líderes da FT Finanças Verdes da Coalizão, analisa as sugestões incorporadas ao Plano Safra e explica como a FT deve apoiar a consulta pública para o Plano ABC+, nova versão da política para a próxima década.

O Plano Safra 2021/2022 destina R$ 5,05 bilhões ao Programa ABC, o dobro do período anterior. A que você atribui esse aumento?

Este Plano Safra mostrou que o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) e o Ministério da Economia (ME) estão priorizando a inovação e a implementação de tecnologias sustentáveis no campo. Isso se deve ao alinhamento de práticas e tecnologias preconizadas pelo Plano ABC, que passaram a ser concentradas no Programa ABC, porque, até então, vários outros programas de crédito financiavam práticas e tecnologias semelhantes. Por exemplo, a criação do subprograma de manejo dos solos, específico para correção e conservação dos solos, que antes era parte do Moderagro e agora veio para o ABC. Houve também a inclusão de mais recursos para outras tecnologias, como aquelas destinadas à geração de energia renovável nas propriedades. O MAPA também está incentivando a produção de bioinsumos e biofertilizantes, e essa atividade está, agora, autorizada a ser financiada pelo Programa ABC. Ou seja, essas mudanças levaram ao aumento do volume de recursos.


De forma geral, quais sugestões feitas pela FT Finanças Verdes foram incorporadas a este Plano Safra?

Neste Plano Safra, tivemos vários aprimoramentos bastante alinhados a nossas propostas. Uma delas foi a harmonização entre os programas do Plano Safra. Ativos fixos referentes a suíno e aviculturas, que, antes, eram financiados pelo Moderagro, foram para o Inovagro, por exemplo. Para o ABC, migrou o financiamento para manejo dos solos. Teve início, também, a discussão das notas técnicas dos recursos dos Fundos Constitucionais*. O Plano Safra não define essa questão, que é responsabilidade dos Conselhos Deliberativos de cada região, mas houve incentivo via Fundos Constitucionais para práticas sustentáveis e para adequação ao Código Florestal. Esse é um ganho importante, em especial nas regiões de fronteira agropecuária.


Também abordamos gestão de riscos e seguro e vimos uma ampliação importante dos recursos para o seguro rural, ainda que sem necessariamente incorporar nossa proposta, que era alinhar os incentivos do bureau verde do Banco Central ao crédito rural também para o seguro rural. Outro ponto importante a ser destacado foi a criação de grupos de trabalho para avaliar os critérios socioambientais das propriedades que acessam o seguro rural, como trabalho análogo ao escravo e existência de áreas embargadas.


*Linhas de financiamento especiais voltadas ao desenvolvimento das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste.


Você citou a migração de alguns itens do Moderagro para o Inovagro e para o ABC. Quais as vantagens disso para o produtor rural?

A vantagem principal, sob a ótica do produtor rural, são as condições de financiamento. O Programa ABC, assim como o Inovagro, possui a menor taxa de juros em relação a outros programas, inclusive ao Moderagro. Não só as taxas são menores, mas também tem prazos de pagamento mais longos. Isso, no entanto, não significa facilidade de acesso, porque o acesso ao recurso do ABC demanda documentação detalhada e projeto técnico bem estruturado. E essa continua sendo uma de nossas preocupações. Vamos acompanhar se os produtores vão conseguir adequar projetos para acessar os recursos do ABC.


Além da exigência em relação à documentação e projeto técnico, outro ponto sempre levantado é o da dificuldade dos operadores financeiros em entender o mecanismo do Programa ABC. Tem havido mudança em relação a esse ponto?

A demanda pelo crédito ABC tem sido crescente, em especial ao longo dos últimos anos-safra, desde que foi feita a diferenciação de condições de financiamento, especialmente dos juros menores e com maior prazo quando em comparação com outras linhas. Em algumas safras, houve, inclusive, suspensão de aceite de novos projetos pelo BNDES porque os recursos haviam se esgotado. Nesse sentido, temos conversado com o ME e o MAPA sobre as dificuldades enfrentadas pelas instituições financeiras. Analisar um projeto para o ABC é bem mais custoso operacionalmente: ele tem custo de transação muito maior que o de outras linhas de créditos e a remuneração, para o banco, é igual às demais. Isso desestimula o operador financeiro a operar o ABC. Mas este Plano Safra trouxe novidades. É a primeira vez que temos as cooperativas de crédito com recursos equalizáveis para o ABC – e isso estava em uma das nossas propostas. Temos também a Caixa Econômica Federal entrando pesadamente no setor agro com recursos expressivos para o crédito ABC, bem como o Banco do Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG) e o Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE). Outra novidade é ampliar o leque de instituições financeiras, trazendo os privados para operar cerca de 1,8 bilhão de reais que qualquer instituição financeira autorizada a operar crédito rural pode usar de recursos obrigatórios (depósitos à vista). Ou seja, os bancos privados não se limitam mais a operar o ABC com recursos do BNDES, tendo, assim, a operacionalização facilitada. Esperamos que o crédito ABC seja reconhecido para finalidades da agenda ASG (ambiental, social e de governança corporativa) e, de fato, usar os recursos obrigatórios para o Programa ABC.


O Plano ABC+, que tratará da política de agricultura de baixa emissão de carbono da próxima década, entrará em consulta pública. Quais serão as contribuições que a FT Finanças Verdes fará, considerando as mudanças desejadas e necessárias para o crédito rural para os próximos dez anos?

Os 10 anos dessa primeira fase do ABC trouxeram resultados expressivos e o Plano tem sido bem-sucedido em fomentar políticas sustentáveis no campo. O ABC+ deve ampliar esse escopo, abrangendo a gestão integrada da paisagem, unindo mitigação e adaptação; adequação ao Código Florestal, que não constava do primeiro ABC por questão de timing (o Plano ABC é de 2010 e o Código, de 2012); tornando a propriedade rural resiliente às mudanças climáticas e com baixa emissão de carbono. Isso é necessário para que o agro consiga minimizar os impactos das mudanças do clima, que já impactam o setor. Esperamos também que os pequenos produtores sejam incluídos no Plano, para terem acesso a tecnologias e práticas para aumentar a resiliência em suas propriedades. Ainda, esperamos que a nova política alavanque o financiamento privado.


Nesse sentido, quais são os próximos passos da FT Finanças Verdes?

Além de trabalhar para contribuir com o Plano ABC+ na consulta pública, queremos continuar apoiando a política agrícola e ampliar o diálogo com o setor privado, com grande presença na Coalizão, sobre a importância de direcionar recursos para o financiamento do uso sustentável da terra para o agro.

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