06/2020

Tempo de leitura: 7 minutos

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Uso da terra no pós-pandemia é tema de debate na plenária da Coalizão Brasil em parceria com o Pacto Global

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Os desafios do uso da terra no país, ante uma nova realidade trazida pela pandemia da Covid-19, foram tema de um debate realizado pela Coalizão Brasil durante a Primeira Plenária de 2020 do movimento, em 8 de junho. A conversa abordou temas como bioeconomia, comportamento do consumidor, engajamento da cadeia de valor, demandas do mercado internacional e infrações ambientais, nesse novo cenário.

“Vamos enfrentar uma realidade bastante modificada nos anos que virão”, afirmou André Guimarães, cofacilitador da Coalizão e diretor executivo do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), na abertura da conversa. “Se sairmos [deste debate] um pouco intrigados com algumas perguntas inusitadas, teremos uma boa matriz para seguir discutindo o futuro do uso da terra neste mundo pós-pandemia.”

O debate, realizado em parceria com a Rede Brasil do Pacto Global, foi transmitido ao vivo pelos canais do YouTube da Coalizão e da UOL, ampliando assim o alcance da discussão, que já soma mais de 5 mil visualizações. Participaram, como debatedores, Ana Luci Grizzi, sócia da área ambiental do Veirano Advogados; Joice Ferreira, ecóloga e pesquisadora da Embrapa Amazônia Oriental; Juliana Lopes, diretora de Comunicação, Sustentabilidade e Compliance da Amaggi e coordenadora da Plataforma de Ação pelo Agro Sustentável do Pacto Global; e Ricardo Abramovay, professor do Instituto de Energia e Ambiente da USP e autor do livro Amazônia: por uma economia do conhecimento da natureza. Guimarães e Marcello Brito, também cofacilitador da Coalizão e presidente da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag), foram os moderadores.

Ainda durante a abertura, Guimarães destacou a importância estratégica do uso da terra para o País. “Somos uma potência ambiental e agrícola e precisamos conciliar essas agendas. Com este tipo de debate, a Coalizão ajuda a sociedade, empresas e governos a se reposicionarem nesse mundo tão desafiador que já tínhamos antes da pandemia e que agora certamente vai se acentuar.”


Expectativa de consumidores e do mercado internacional

Para Juliana Lopes, um dos pontos importantes para o futuro próximo é acompanhar como o consumidor vai se posicionar, além de ser necessário ficar atento à entrega das cadeias de valor e às políticas públicas. “Consumidores, países da Europa e o mercado chinês estão de olho em como vamos nos posicionar em termos de uso da terra, movimentação da cadeia de valor, rastreabilidade, e de que maneira conto a história da produção de meu produto”, afirmou.

Seguindo com o tema do papel e potencial do Brasil no cenário internacional, Ana Luci Grizzi abordou como o pleito do governo atual para que o país entre na Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) pode ser positivo para a pauta do uso da terra.

Segundo Grizzi, na OCDE existem cerca de 70 normas ambientais. “Isso só já basta para comprovar que meio ambiente e economia estão intrinsecamente relacionados. Sem recurso natural, sem economia”, afirmou a especialista. Ela deu exemplos de normas a que o País terá de se adequar caso se torne membro da OCDE, como a adesão a instrumentos econômicos para promover uso sustentável da biodiversidade.

Sistemas agroflorestais e inovação tecnológica na Amazônia

Joice Ferreira, da Embrapa Amazônia Oriental, lembrou os muitos aspectos positivos trazidos pela produção agropecuária aliada à conservação ambiental na Amazônia, incluindo sistemas agroflorestais. “Temos estudos da Embrapa mostrando que a produção de açaí é 25% maior quando os açaizais são em áreas nativas”, disse a pesquisadora. Apontou, porém, que é preciso dar mais assistência para que agricultores familiares e assentados possam participar dessa produção sustentável.

A Amazônia também foi um dos temas abordados pelo escritor e professor Ricardo Abramovay, desta vez sobre o potencial para a bioeconomia na região. “Temos que ter a ambição não só de parar a destruição da floresta, mas de fazer com que territórios e populações, inclusive as ribeirinhas, junto com comunidade científica, com ativistas, essa comunidade construtiva, contribuam para que a Amazônia – e com isso o Brasil – ocupe a fronteira da inovação tecnológica global, em uma área tão importante e promissora como a bioeconomia”, afirmou.

Abramovay também destacou que a pandemia do novo coronavírus traz mais reflexões sobre a maneira como os alimentos são produzidos, em especial a carne de aves e suínos. A homogeneização genética dos animais, almejada por questões mercadológicas, facilita a propagação de vírus entre eles. “Temos que repensar o tema da diversidade nas maneiras de produzir alimentos”, disse. “Esse é um assunto estratégico que nós, da Coalizão, e toda a sociedade precisamos pensar.”

Ainda sobre a questão da bioeconomia, Marcello Brito disse sentir uma real necessidade de se debater o potencial que existe entre o que se chama de bioeconomia da floresta e a bioeconomia que advém de setores consolidados da economia, como o agro ou outros. “Na Europa vemos isso. Mas, no Brasil, nós nos esquecemos que há milhões de hectares na Amazônia já antropizados e degradados há décadas, que poderiam ser melhor explorados nessa união das bioeconomias”, afirmou.

O debate entre os quatro especialistas e dois moderadores abordou ainda assuntos como os desafios de se combater crimes ambientais, como o do desmatamento. O cofacilitador da Coalizão, André Guimarães, lembrou que a continuidade da derrubada da floresta pode afetar o ciclo das chuvas e comprometer a vantagem que o Brasil tem em relação a outros países, por conseguir, por exemplo, produzir duas safras. “A pergunta é por que ainda não conseguimos incorporar na equação econômica da agricultura o custo de manter a Amazônia íntegra para poder irrigar o Cerrado, vender soja barata para nossos clientes. Essa equação tem que, de alguma maneira, premiar os coletivos que preservam a Amazônia. O agricultor brasileiro deveria ser o melhor amigo do indígena.”

A necessidade de grandes empresas verem a Amazônia como um lugar para se investir, e não apenas fazer filantropia, também foi lembrada. Foi discutida ainda a pressão que recai sobre o produtor para que ele adote práticas sustentáveis, sem que haja o mesmo nível de comprometimento em toda a cadeia de valor. 

O debate, bem como toda a Plenária, pode ser assistido no YouTube da Coalizão.

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