08/2021

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Webinários debatem o papel do setor privado e o Cerrado à luz da COP 26

Nos meses de junho e julho aconteceram mais dois webinários realizados pelo jornal Valor Econômico, em parceria com a Coalizão Brasil. Os eventos fazem parte de uma série de debates preparatórios para a COP 26, que acontecerá em novembro, em Glasgow (Reino Unido). A partir dessas discussões, a Coalizão consolidará um documento com recomendações relacionadas ao uso da terra que será entregue aos negociadores do Brasil.


O webinário de junho abordou o papel do setor privado na ação climática, e o de julho discutiu as oportunidades para conciliar agropecuária e conservação no Cerrado. O próximo acontecerá em 25 de agosto e terá como tema “O Acordo de Paris e as oportunidades para a conservação e a produção sustentável na Amazônia”. As inscrições poderão ser feitas aqui.


Veja, a seguir, como foram os webinários realizados em junho e julho.

Os desafios das empresas na ação climática

O papel do setor privado brasileiro frente às mudanças climáticas foi o tema do terceiro webinar da série, que aconteceu em 28 de junho. O desafio de levar a sustentabilidade a toda a cadeia de valor, a importância do apoio a pequenos produtores, as tecnologias para a transição energética e o desmatamento foram alguns dos pontos destacados no debate.


Participaram do webinar Caio Carvalho, diretor da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag), Carolina da Costa, sócia da Mauá Capital, Cristiano Teixeira, diretor-geral da Klabin, e Gilberto Tomazoni, CEO Global da JBS. Fernando Lopes, editor de Agronegócios do Valor, e Marcello Brito, cofacilitador da Coalizão Brasil e presidente da Abag, foram os mediadores da conversa. Para assistir ao webinar, acesse aqui.


O painel teve início com Cristiano Teixeira, da Klabin, que foi a única empresa brasileira a ser convidada a integrar o “COP 26 Business Leaders”, grupo formado por dez executivos da iniciativa privada para promover a economia de baixo carbono. “Nosso papel é engajar o maior número possível de empresas para aderir a metas de redução de carbono”, afirmou Teixeira. Segundo ele, uma das expectativas da COP é que os governos evoluam nas negociações sobre a regulação do mercado de carbono.


Na sequência, Caio Carvalho, da Abag, falou sobre as oportunidades que o RenovaBio ocasionou ao setor sucroalcooleiro, por trazer mais confiança, na medida em que os planos são decenais e permitem mais planejamento, e por trazer mais atores, como a indústria automobilística, para a discussão.


Carvalho também abordou a questão da transição energética e disse que, enquanto alguns países ainda estão se atualizando sobre o melhor combustível que poderão usar, o Brasil está em um nível de detalhamento de como melhorar o que já está montado. “Concluiu-se, em estudos, que o carro flex brasileiro emite menos que o carro elétrico europeu”, afirmou.


Carolina da Costa, da Mauá Capital, destacou que o setor privado será cada vez mais pressionado a ter transparência em relação a riscos e metas de sustentabilidade. Ela lembrou que, segundo um estudo da International Finance Corporation (IFC), até 2030 o Brasil poderá receber US$ 1,3 trilhão em investimentos verdes, mas, para que esses aportes aconteçam, transparência e indicadores reportáveis e mensuráveis serão fundamentais.


Assim, quando as empresas criam metas para atingir a neutralidade de carbono, é preciso apresentar como isso será feito. “Não basta apenas fazer um pledge de chegar a net zero, se não se conseguir mostrar como a transição será feita.” O principal desafio para as empresas, disse, está no chamado escopo 3, ou seja, em sua cadeia de valor. Os bons cases “são as empresas que fazem trabalho sistêmico em suas cadeias de valor, não só com fornecedores, mas também com as comunidades”, afirmou.


Gilberto Tomazoni, da JBS, também falou sobre a importância dos fornecedores para cumprir a meta da empresa de se tornar net zero até 2040. Para alcançar esse objetivo, a companhia pretende investir US$ 1 bilhão. Segundo o executivo, 95% do desafio está na cadeia de fornecedores. “O primeiro ponto é garantir que a nossa política de desmatamento zero seja cumprida”, afirmou. Para monitorar os fornecedores indiretos, que era uma das principais dificuldades, a empresa implantou uma tecnologia de blockchain e criou três “escritórios verdes”, que têm como objetivo apoiar os fornecedores para se adequarem. A partir de 2025, somente serão aceitos na cadeia da companhia fornecedores que atendam a todos os requisitos. “Acredito que esse investimento que estamos fazendo aumentará a competitividade da empresa e teremos mais igualdade e sustentabilidade na nossa cadeia”, afirmou.


A importância de levar assistência técnica e tornar o financiamento mais acessível para os pequenos produtores também foi abordada pelos debatedores. O cooperativismo foi visto como algo positivo, por ajudar a integrar produções que, caso contrário, estariam mais pulverizadas, e por facilitar a disseminação de conhecimento, assistência técnica e acesso a crédito.


Para Costa, é importante que haja um pensamento de longo prazo para que os pequenos produtores vejam oportunidade em conservar recursos naturais. “Nossa experiência é que as empresas mais bem-sucedidas são as que elaboram um modelo econômico completo, estabelecendo métricas para a cadeia de suprimentos, prorrogando contratos para que haja uma relação longa de compra, investindo em assistência técnica e criando incentivos para que todos vejam oportunidade em primar pela preservação”, disse.


Perguntados sobre como o setor privado pode agir efetivamente no combate ao desmatamento ilegal, os participantes do webinar concordaram que, além do engajamento do setor privado, é preciso haver fiscalização e mais ações do governo. “Nós, empresários, precisamos cobrar o governo, oferecer ajuda e cumprir o nosso papel nas nossas cadeias”, disse Teixeira. “Há muito trabalho pela frente, mas façamos com otimismo.”

O Cerrado pode alimentar o mundo de forma sustentável

O tema do quarto webinar, que aconteceu em 29 de julho, foi “O Acordo de Paris e as oportunidades para conciliar produção agropecuária e conservação no Cerrado”. Participaram como debatedores Ludmila Rattis, bióloga e pesquisadora do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam) e do Woodwell Climate Research Center, dos Estados Unidos, Aurélio Pavinato, diretor-presidente da SLC Agrícola, e André Nassar, presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove). Os moderadores foram Juliana de Lavor Lopes, diretora de ESG, Comunicação e Compliance da Amaggi e membro do Grupo Executivo da Coalizão Brasil, e Fernando Lopes, editor de agronegócios do Valor Econômico. Para assistir a este webinar, acesse aqui.


Os números apresentados pelos debatedores mostram a forte vocação do Cerrado como produtor de alimentos e de como não é preciso desmatar para aumentar a produtividade no bioma.


Com cerca de 37 milhões de hectares voltados para cultivo, sendo a soja a produção em 19 milhões deles, o Cerrado é altamente produtivo. Enquanto a média de produção mundial de grãos por hectare é de 3,6 toneladas, segundo Pavinato, da SLC, no Brasil essa quantidade sobe para 5,5 toneladas/hectare. “No Cerrado, esse potencial pode alcançar 6,5 ou 7 toneladas/hectare quando plantamos soja e depois milho, ou seja, safra e safrinha. É um solo muito mais eficiente”, comentou.


Aumentar a produtividade é uma das saídas para o crescimento de produção sem aumento de área. A outra é o uso das pastagens degradadas, que chegam a cerca de 30 milhões de hectares no bioma. “Dos 19 milhões de hectares de produção de soja, cerca de 4,5 milhões são vegetação nativa. Parte dela pode ser aberta legalmente, mas o que precisamos conscientizar o produtor é de que provavelmente a maior parte desse solo não é apto para produção, portanto não vale a pena desmatar, ainda que ele tenha esse direito”, explica Nassar. “Também precisamos que ele entenda que onde é degradado, ele pode recuperar e ter boa produtividade ali.”


“O bacana deste espaço de discussão é perceber que queremos o mesmo, que é produzir mais, não desmatar e recuperar áreas degradadas, ainda que por caminhos um pouco diferentes”, ressaltou Rattis. A pesquisadora afirmou que 55% do Cerrado foi desmatado e o aumento na temperatura média já pode ser sentido. “Sem o regime correto de chuva e a temperatura ideal, se sabe que não é possível haver safra e safrinha. Com isso, se perde em produção na agricultura, inclusive no modelo de irrigação, que precisa ir buscar água em outra região.”


Rattis citou um estudo realizado pelo Ipam e pela Woodwell que mostra que a evapotranspiração das plantas (evaporação da água da vegetação úmida e por transpiração das plantas) é equivalente entre vegetação nativa e cobertura agrícola. “Isso acontece se a cobertura agrícola for presente o ano todo, com safra e safrinha. Indica que investir na adaptação de cultivares é urgente e já está sendo feito. Mas é preciso investir em mitigação também, para termos uma paisagem agrícola resiliente, que conserve o solo e a vegetação nativa”. Ela afirmou, inclusive, que a agricultura pode ser a grande produtora de água no país, a depender do caminho escolhido. “Com redução das altas taxas de desmatamento e das áreas degradadas e melhoria na gestão das práticas agrícolas em áreas convertidas legalmente, é possível reduzir impactos ambientais e sociais.”


Os participantes concordaram que o que falta para dar mais segurança ao consumidor das commodities brasileiras é mostrar que existe punição para quem não cumpre a lei. “O estado precisa fiscalizar o que está errado. O que é legal hoje já é o bastante para termos produtividade, mesmo com o aumento da população mundial”, disse Pavinato. “Isso precisa ficar claro na próxima COP: temos tecnologia e recursos para crescermos em produção no Cerrado brasileiro e essa produção pode ser cada vez mais sustentável. Isso precisa ser mostrado internacionalmente para os mercados consumidores.”

Saiba mais sobre como foram os dois primeiros webinários
Os dois primeiros webinários desta série de debates abordaram o que estará em jogo na COP 26 e a ciência e o papel do Brasil no cenário climático internacional.

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