A Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura, movimento multissetorial que reúne mais de 370 membros do setor privado, financeiro, academia e organizações da sociedade civil, considera oportuno o lançamento da consulta pública para a 4ª fase do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento e das Queimadas no Bioma Cerrado (PPCerrado). O avanço da agenda de descarbonização do Brasil, a segurança alimentar global e o desenvolvimento do setor agropecuário dependem desse bioma. Por isso, assim como avaliamos positivamente a nova fase do PPCDAm, anunciada em junho, também celebramos a extensão desse debate para o Cerrado.
O lançamento da consulta pública está alinhado à proposta da Coalizão de reestruturar e implementar o PPCerrado, apresentada no documento “O Brasil que vem: propostas para agenda agroambiental do país a partir de agora”, que traz 33 recomendações para os quatro anos da gestão atual do governo federal. O documento, que foi lançado em novembro do ano passado e entregue à equipe de transição do governo, previa essa ação emergencial já para o primeiro dia do novo mandato presidencial.
Destacamos a importância da transversalidade do PPCerrado, demonstrada pela gestão da Comissão Interministerial Permanente de Prevenção e Controle do Desmatamento, envolvendo a participação de 17 ministérios, além da pasta de Meio Ambiente e Mudança do Clima, responsável pelo secretariado da comissão, e da Casa Civil da Presidência da República, que preside o grupo.
Ainda, celebramos a proposta do Plano de promover o trabalho conjunto entre a União e os estados do Cerrado para, por meio de ações estruturantes, obter melhores resultados no controle do desmatamento e de incêndios florestais, por meio dos Planos Estaduais de Prevenção e Controle do Desmatamento e Queimadas (PPCDQs). Os estados têm papel fundamental para o avanço das análises do Cadastro Ambiental Rural (CAR). Cabe destacar ainda a atuação potencial dos municípios na prevenção e controle do desmatamento, motivo pelo qual ressaltamos a importância de sua capacitação e sua articulação com estados e o governo federal, ainda que através de organizações que os representem.
No documento lançado para consulta pública, o governo reconhece que o desenvolvimento do PPCerrado se beneficiou do diálogo com a sociedade civil e a academia em diversas oportunidades. Ressaltamos que é essencial garantir a continuidade dessa interlocução, encontrando caminhos e instrumentos adequados para monitoramento e escuta constantes da sociedade.
O Plano, com seus quatro eixos que trazem não só objetivos relacionados a comando e controle, mas também abordagens alternativas e instrumentos econômicos que viabilizem o desenvolvimento sem desmatamento, apresenta um olhar sistêmico que consideramos fundamental, especialmente para o Cerrado. Dele vem metade da soja exportada pelo Brasil e 55% da produção nacional de carne bovina. Sem a participação da agropecuária no bioma, a economia brasileira e seu papel na segurança alimentar global não teriam a atual dimensão.
No entanto, o Cerrado, a savana mais biodiversa do planeta, que abriga as nascentes de oito bacias hidrográficas do Brasil, já perdeu mais da metade de sua cobertura vegetal, e o cenário de devastação avança. O aumento da supressão da vegetação original foi de 21% no primeiro semestre de 2023 em relação ao mesmo período do ano anterior, segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). Foram desmatados mais de 500 mil hectares entre janeiro e julho deste ano. Este índice cresce notadamente no interior de grandes propriedades privadas, e mais da metade das ocorrências está relacionada a práticas ilegais.
Vale destacar que 62% do que ainda existe de vegetação nativa do Cerrado estão em propriedades privadas, segundo o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM). Como o Código Florestal permite ao proprietário da terra neste bioma desmatar até 80% da vegetação, é importante que haja alternativas econômicas que incentivem a manutenção dessa cobertura. A produção de commodities também deve ser fortemente encorajada a erradicar o desmatamento de sua cadeia produtiva, uma iniciativa que impulsionaria a conservação ambiental e atenderia às mudanças na legislação de países que importam os produtos brasileiros, além da União Europeia. Portanto, visando a desvinculação entre produtos agropecuários e desmatamento, defendemos que o país estabeleça um sistema nacional de monitoramento, rastreabilidade e transparência, que abranja a complexidade das cadeias de commodities. Para a Coalizão, essa ação merece destaque no PPCerrado.
Outro destaque das contribuições da Coalizão, detalhadas no anexo deste documento, é o reforço à importância da restauração da vegetação nativa para a conservação do bioma e recuperação de serviços ecossistêmicos, além do seu potencial para geração de emprego e renda e para o cumprimento das metas brasileiras de restauração, especialmente no âmbito do Acordo de Paris. Além disso, para o Cerrado é de grande relevância que haja ações voltadas ao monitoramento e manejo de incêndios florestais, promoção da agricultura de baixo carbono, incentivos à agricultura familiar sustentável – incluindo acesso a crédito e tecnologias – e integração de programas voltados a pequenos produtores, como assistência técnica e extensão rural (ATER), Bolsa Verde e Luz para Todos. Torna-se primordial, ainda, a integração das bases de dados do Sistema Nacional de Cadastro Ambiental Rural (SICAR) e dos cadastros fundiários, pois isso possibilita, em um mesmo esforço, promover a regularidade ambiental e fundiária. Essa ação contribuiria, inclusive, para o fortalecimento da rastreabilidade das cadeias produtivas e do monitoramento socioambiental de maneira geral.
Nesse sentido, ressaltamos a importância da transparência ativa facilitada, de forma a garantir a utilização dos dados pelos diferentes atores da sociedade. Essa transparência é necessária para todo o conjunto de sistemas federais, assim como sua integração e a interoperabilidade entre sistemas e com bases estaduais e municipais. Vale mencionar que foi visto de forma positiva que o Plano traga alguns trechos amadurecidos em relação ao PPCDAm, quando este foi apresentado para consulta pública. Diversas contribuições enviadas anteriormente no contexto do PPCDAm já aparecem incorporadas e adaptadas nessa versão do PPCerrado, o que mostra o benefício desses processos de ampla escuta com a sociedade para a formulação de políticas públicas.
Ainda que o PPCerrado traga em sua contextualização uma definição do entendimento sobre “desmatamento zero” no âmbito do Plano – conforme a Coalizão havia sugerido para o PPCDAm – ressaltamos que é importante que o termo seja utilizado de forma coerente ao longo de todo o texto, e dos diferentes eixos, objetivos, resultados esperados e linhas de ação.
O Plano indica que serão incluídos indicadores e metas em seu quadro síntese. Porém, sua ausência na versão preliminar do Plano, aberta para consulta pública, combinada com o estabelecimento de linhas de ação em sua maioria amplas e genéricas, dificultam a compreensão em relação a que ações especificamente serão realizadas para alcançar os resultados esperados. A Coalizão espera, assim, que na versão final do Plano sejam descritas as metas, indicadores, prazos e atores-chave, assim como foi feito para o PPCDAm, o que irá apoiar de forma expressiva a implementação efetiva do Plano e seu monitoramento. Sugerimos também que o quadro-síntese traga a identificação do grau de complexidade da implementação das ações, assim como seu nível de prioridade (alta, média e baixa).
Temos, como movimento multissetorial, a visão de que só é possível avançar rumo a um desenvolvimento sustentável, justo e inclusivo para o Brasil com o fim do desmatamento e a promoção de uma economia baseada na floresta de pé, em atividades com baixa emissão de carbono e a promoção da inclusão social. Para isso, é importante que os planos de ação para prevenção e controle do desmatamento e da degradação sejam parte de uma estratégia nacional que aborde todos os biomas do país.
Reiteramos a importância da implementação do PPCerrado, que, em suas fases anteriores, alcançou resultados positivos na redução da taxa de desmatamento, e a necessidade de uma atuação conjunta e articulada de todos os setores da sociedade para enfrentar os desafios do bioma. A Coalizão está comprometida em contribuir para essa agenda agroambiental e continuará trabalhando em conjunto com seus membros e parceiros para a construção de um futuro sustentável para o Brasil.
As contribuições a seguir foram elaboradas por meio de uma consulta ampla envolvendo dezenas de membros das Forças-Tarefa temáticas que representam os diversos setores agregados pela Coalizão.
ii.1. Coalizão Brasil: Contribuições sobre o Eixo I – Atividades produtivas sustentáveis
Com relação ao conteúdo geral do Eixo I, relacionado a atividades produtivas sustentáveis, notamos a ausência de objetivos, resultados e linhas de ação relacionados ao setor de plantações florestais. Reforçamos a importância – destacada também na contribuição da Coalizão à consulta pública sobre a Fase V do PPCDAm – que os Planos de Ação para Prevenção e Combate ao Desmatamento e às Queimadas contemplem todos os setores produtivos, inclusive o de plantações florestais. Portanto, é importante que o plano leve em consideração essa ausência significativa e ao menos mencione a importância desse setor para a economia e o desenvolvimento sustentável. Novamente, consideramos primordial também a participação do setor privado na definição dessa estratégia nacional, de forma a alinhar as políticas públicas aos interesses e oportunidades prioritários aos negócios na região, para subsidiar as ações de organização coletiva e comunitária, bem como a criação de empregos verdes.
Objetivo 1. Promover a sociobioeconomia, o manejo florestal sustentável e a recuperação de áreas desmatadas ou degradadas
Assim como ocorreu no PPCDAm, o Plano adota a promoção da bioeconomia como uma de suas estratégias, trazendo-a repetidamente em seu primeiro objetivo estratégico. Contudo, o texto não traz uma definição para bioeconomia ou o conceito sobre como se deve promovê-la. Para evitar o risco de interpretações diversas, recomenda-se inicialmente que seja estabelecida uma definição dos termos no documento. Ainda, é importante que esta definição esteja em harmonia com o Plano de Transformação Ecológica proposto pelo Ministério da Fazenda, e com o Plano de Ação da Taxonomia Sustentável Brasileira, também em consulta pública.
A bioeconomia, na visão da Coalizão, explora a interface entre agricultura, pecuária e florestas, com o objetivo de escalar sistemas produtivos sustentáveis e biodiversos, que promovam restauração de paisagens, regeneração do solo, conservação de biodiversidade, valoração dos serviços ecossistêmicos e eficiência agropecuária. O ponto de partida é proteger o solo agrícola contra dessecação e erosão, aumentar matéria orgânica e a capacidade de retenção de água no solo. Além disso, os sistemas devem buscar menor dependência de fertilizantes inorgânicos e promover o Manejo Integrado de Pragas (MIP) com foco em controle biológico e inoculação, entre outras evoluções das práticas de manejo da produção rural e florestal. A Coalizão também participou da consulta pública sobre o Programa de Bioeconomia e Desenvolvimento Regional Sustentável (BioRegio), em que trouxe contribuições aos objetivos do programa e ao conceito de bioeconomia (veja nossas contribuições aqui).
O resultado esperado 1.1 propõe diversas linhas de ação para o desenvolvimento da bioeconomia, sociobiodiversidade e transição agroecológica no bioma, incluindo aelaboração e implementação de programas e ações de apoio à bioeconomia no Cerrado (1.1.1), como o Programa Nacional da Sociobioeconomia e outros programas visando o aperfeiçoamento das estatísticas de produção de produtos nativos. Também são destacados o incentivo à pesquisa aplicada em temas como o aproveitamento alimentar de espécies nativas e seu uso em indústrias diversas, além da promoção das agroindústrias e bioindústrias da sociobioeconomia.
Considerando que a implementação do Programa Nacional da Sociobioeconomia está prevista no âmbito do PPCDAm, é fundamental lembrar que a abordagem da bioeconomia varia de acordo com diferentes visões e vocações de cada região, sendo assim necessário adotar abordagens específicas de desenvolvimento para cada bioma, ainda que ancoradas em uma diretriz nacional comum.
O Plano tampouco detalha que outros Programas e ações específicas serão implementados para apoiar a bioeconomia no Cerrado. Nesse sentido, é importante reforçar a importância da integração e coordenação entre os programas voltados a pequenos produtores e extrativistas, não somente daqueles citados na linha de ação 1.1.2, que prevê o fortalecimento e ampliação de políticas e programas e compras governamentais existentes como PAA, PNAE, PGPM-Bio e Selo da Agricultura Familiar, mas também de programas de ATER e programas sociais como o Bolsa Verde e o Luz para Todos, entre outros.
Ainda que a diversificação da produção da bioeconomia no Cerrado e a redescoberta de espécies nativas mencionadas no texto do Plano sejam uma necessidade latente, é importante endereçar também, em programas e políticas, as carências das diversas cadeias cujo uso econômico já ocorre, como aquelas relacionadas à organização coletiva, acesso a mercados, pesquisa, ATER, entre outras. Para além da criação de condições institucionais que favoreçam a disseminação do uso econômico das espécies nativas, é necessário que o Estado apoie e invista em todos os elos dessas cadeias.
É fundamental, ainda, fortalecer e desenvolver novas ações que ampliem o acesso às políticas e programas de compras governamentais, sobretudo a povos e comunidades tradicionais. A invisibilização desses povos e culturas, tão diversos também, inevitavelmente impacta na promoção deste objetivo e na dinâmica de desmatamento no bioma.
Assim, além das políticas e programas já mencionados, recomenda-se que a linha de ação 1.1.3 (promover negócios sustentáveis e criar empregos verdes, fortalecendo a bioeconomia, transição agroecológica e etnodesenvolvimento) contemple entre suas metas ações relacionadas a:
O fortalecimento e ampliação da assistência técnica, embora previstos no resultado esperado 3.2, são fundamentais para alcance do resultado 1.1, especialmente quando tratamos da agricultura familiar, manejo florestal comunitário e das organizações coletivas. Destaca-se também a importância dos incentivos fiscais e financiamento para produtos oriundos da sociobioeconomia previstos nas linhas de ação do resultado 12.3 para a ampliação e fortalecimento da bioeconomia, sociobiodiversidade e transição agroecológica no Cerrado.
O objetivo estratégico 1 trata também do turismo de natureza, etnoturismo e turismo regenerativo (resultado 1.2), promoção do manejo florestal sustentável (resultado 1.3) e da recuperação de áreas desmatadas ou degradadas (resultado 1.4). Novamente com relação aos termos utilizados, tendo em conta a variedade de formações florestais presentes no bioma e descritas em sua caracterização nas primeiras páginas do Plano, sugere-se a substituição do termo “manejo florestal” por “manejo da vegetação nativa”, considerando-se assim também as formações campestres e savânicas do bioma. Da mesma forma, sugere-se substituir o termo “recuperação” por “restauração”, buscando alinhamento com as diretrizes e iniciativas globais da ONU, em que recomenda-se o uso do termo “restauração”.
No resultado esperado 1.3, a Coalizão notou a falta de menção específica ao manejo comunitário da vegetação nativa, modelo fundamental para promoção da sociobioeconomia e atividades sustentáveis entre povos e comunidades tradicionais. Com relação a este resultado, é importante reforçar a importância de:
Já o resultado esperado 1.4 refere-se à restauração florestal por meio de concessões e silvicultura de espécies nativas, além de iniciativas de recuperação da vegetação nativa. Ainda que contemplada por meio deste resultado e linha de ação, a percepção é de que não se dá no Plano a importância que a restauração da vegetação nativa apresenta para o bioma, especialmente para a recuperação dos serviços ecossistêmicos, conservação da biodiversidade, aumento dos estoques de carbono, conservação de recursos hídricos, além do potencial de geração de emprego e renda. Notamos, inclusive, a falta da menção à conservação de recursos hídricos na redação da linha de ação 1.4.1, apesar de este ter sido explicitado como um argumento fundamental para conservação e recuperação do bioma na caracterização trazida no Plano de Ação. Vale lembrar também que o Brasil estabeleceu a meta de restaurar 12 milhões de hectares de áreas desmatadas até 2030, como parte dos compromissos do Acordo de Paris, dos quais 4 milhões estão no Cerrado.
Por este motivo, a Coalizão sugere avaliar a possibilidade de desmembrar o Objetivo 1 em dois: o primeiro voltado à promoção da sociobioeconomia e manejo sustentável da vegetação nativa e o segundo focado na restauração de áreas desmatadas ou degradadas e o fortalecimento da cadeia da restauração da vegetação nativa, de forma a contemplar e apoiar as particularidades da cadeia da restauração e apoiar a implementação do Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa (Planaveg).
A linha de ação prevista para o resultado 1.4 tampouco traz clareza sobre a forma através da qual o Plano pretende implementar a restauração. Desta maneira, sugerimos que sejam estabelecidas linhas de ação mais específicas para o atingimento deste resultado, como:
1) Estruturação da cadeia da restauração da vegetação nativa, crucial para viabilizar a recuperação das pastagens, haja vista a necessidade de mais viveiros, coletores de sementes, apoio às comunidades para monitoramento e outras atividades;
2) Fomento à coordenação entre os atores da cadeia produtiva da restauração e recomposição da vegetação nativa, através de iniciativas como a ARATICUM – Articulação pela Restauração do Cerrado, e também de redes de coletas de sementes e viveiros, considerando seu papel na conservação da biodiversidade e restauração, além da geração de renda, equidade de gênero e sensibilização das comunidades para o tema;
3) Articulação com os estados para promover ações efetivas para avanço dos PRAs e PRADAs.
Objetivo 2. Estimular atividades agropecuárias sustentáveis
O objetivo estratégico 2, assim como seu resultado esperado 2.1, trata do estímulo às atividades agropecuárias sustentáveis, dando ênfase à produção de grãos e carne. Primeiramente, nota-se a ausência já mencionada de resultados e linhas de ação específicas para outros setores produtivos, como o de plantações florestais.
Com relação à linha de ação 2.1.1, que se propõe a “Incentivar a pecuária e a produção de grãos sustentáveis, com a diminuição da pressão sob áreas críticas de desmatamento, assegurando a promoção social, ambiental e econômica da agropecuária”, sugerimos a substituição da palavra “sob” por “sobre” no texto. Sugerimos, adicionalmente, que a linha de ação não se restrinja à produção de grãos, mencionando também a produção de alimentos de maneira geral.
Também é importante estabelecer com maior clareza que ações serão realizadas para a diminuição da pressão sobre as áreas críticas de desmatamento que se propõe. Nesse sentido, a Coalizão notou com preocupação a ausência de uma estratégia voltada à rastreabilidade para o controle de origem de commodities agrícolas e carne, ainda que o texto relativo ao Eixo I do Plano mencione a importância de iniciativas de rastreabilidade, certificação e promoção comercial da agropecuária sustentável. O Plano não traça, por meio de objetivos estratégicos, resultados e linhas de ação, iniciativas visando o estabelecimento de um sistema de monitoramento, rastreabilidade e transparência para a pecuária, a produção de grãos e outros produtos agrícolas, o que a Coalizão compreende como essencial para incentivar a sustentabilidade nessas cadeias. Desta forma, reforçamos a necessidade de que essa estratégia seja considerada entre os incentivos contemplados na linha de ação 2.1.1, além de ser contemplada de forma mais robusta no objetivo estratégico 5.
Assim, sugerimos que o texto da linha de ação seja:
2.1.1. Incentivar a pecuária e a produção de grãos e alimentos sustentáveis, com a diminuição da pressão sobre áreas críticas de desmatamento, assegurando a promoção social, ambiental e econômica da agropecuária e a rastreabilidade para o controle de origem da produção agropecuária.
Vale destacar ainda, que, embora a fronteira agropecuária na região do Matopiba mereça a atenção especial dada no texto do Plano, o desmatamento em outros estados, como Mato Grosso, também subiu, apesar da abundância de áreas degradadas. Nesse sentido, a expansão da produção de grãos e pecuária sobre áreas já convertidas, colocada como prioritária para as políticas econômica, agrícola e ambiental no texto do Plano, é também uma preocupação da Coalizão e deve ser incentivada.
É importante considerar, contudo, que a produção de grãos e pecuária apresentam hoje realidades distintas de produtividade no Cerrado. Se por um lado a produtividade de grãos já alcança altos índices no bioma, o contrário ocorre com a pecuária, portanto esta deve ser priorizada nas ações relacionadas à intensificação produtiva nas áreas já convertidas em pastos e em degradação. Além disso, consideramos oportuno realizar estudos de risco e oportunidades, resultando em um zoneamento para expansão de grãos e de manejo e intensificação de pastagens sobre áreas degradadas, de maneira a assegurar que o uso da terra seja adequado à manutenção dos serviços ecossistêmicos e sociais em escala local/regional, considerando por exemplo: riscos hídricos, manutenção dos modos de vida e deslocamento de populações tradicionais, indígenas e quilombolas, aptidão do solo, conservação da biodiversidade.
No que se refere a modelos produtivos alternativos para intensificação da produção e aumento da produtividade, destacamos a importância do estímulo não apenas à integração lavoura-pecuária citada no texto do Plano, como de outros modelos como integração lavoura-pecuária-floresta, sistemas agroflorestais, sistemas agrocerratenses e atividades agropecuárias consorciadas com a silvicultura, por exemplo.
Com relação à linha de ação 2.1.2, que refere-se ao fortalecimento do acesso ao mercado e às políticas públicas da agricultura familiar, reforçamos novamente a importância de que tal ação esteja integrada com os resultados e linhas de ação do objetivo 3 (Ampliar a pesquisa, a produção de conhecimento, a formação e a assistência técnica para as atividades produtivas sustentáveis) e com os resultados esperados 12.3 (Incentivos fiscais, subvenções e financiamento para as atividades produtivas e negócios sustentáveis da biodiversidade criados e implementados), 12.4 (Crédito rural aprimorado) e 12.6 (Investimentos verdes). Também sugerimos que seja contemplada pela linha de ação 2.1.2 o fortalecimento do acesso ao mercado e políticas públicas da agricultura não familiar. Há necessidade também, de corrigir o texto da linha de ação no termo “acesso a mercado”, substituindo-o por “acesso ao mercado”. Assim, sugerimos que o texto da linha de ação seja:
2.1.2 Fortalecimento e ampliação do acesso ao mercado e às políticas públicas da agricultura familiar e não familiar.
Finalmente, vale mencionar que, no objetivo 2, notamos a ausência de resultados esperados e de linhas de ação referentes ao fortalecimento da gestão e governança da irrigação de atividades agropecuárias. A irrigação é uma prática bastante utilizada no bioma e o próprio texto do Plano menciona que é possível notar a redução hídrica dos aquíferos utilizados para irrigação. Assim, considerando a relevância da manutenção da qualidade e disponibilidade dos recursos hídricos no bioma, é fundamental que estas atividades sejam geridas de maneira a garantir a continuidade dos serviços ecossistêmicos e a própria sustentabilidade das atividades agropecuárias no longo prazo.
Objetivo 3. Ampliar a pesquisa, a produção de conhecimento, a formação e a assistência técnica para as atividades produtivas sustentáveis
O objetivo 3 tem como foco a ampliação da pesquisa, produção de conhecimento e assistência técnica para as atividades produtivas sustentáveis. Este objetivo e seus resultados esperados se colocam como estratégia de apoio para os objetivos 1 e 2. Sob esta perspectiva, a Coalizão reforça a importância de que sejam previstos programas e ações direcionados especificamente a ampliar o orçamento para pesquisa e produção de conhecimento voltados à bioeconomia, sociobiodiversidade e transição agroecológica no Cerrado (resultado esperado 1.1). Da mesma forma, a pesquisa, produção de conhecimento e assistência técnica são primordiais para melhorar os níveis de produtividade das atividades produtivas no bioma (resultado esperado 2.1), assim como para a expansão da produção sobre áreas já abertas e redução da pressão sobre novas áreas. Adicionalmente, vale reforçar neste objetivo a necessidade de que estas ações sejam promovidas tanto para técnicos quanto para comunidades, reforçando e valorizando os diferentes saberes sobre o Cerrado.
Na linha de ação 3.1.1, que trata da produção de conhecimento, disseminação de informação, conscientização, formação e capacitação de agentes sociais para a importância da conservação, da adoção de práticas produtivas e o consumo sustentáveis para a redução do desmatamento e dos incêndios florestais no Cerrado, sugerimos a exclusão da palavra “florestais”, considerando as outras fitofisionomias do bioma e o risco apresentado por qualquer incêndio aos seus ecossistemas.
Ainda com relação a linha de ação 3.1.1 e o resultado esperado 3.1, do qual faz parte, destacamos a importância da produção, integração e transparência ativa com acesso facilitado às bases de dados disponíveis sobre os produtos da sociobioeconomia e da agropecuária, como aqueles produzidos pelo IBGE, CONAB, entre outros. Atualmente, nota-se que são utilizadas metodologias, linguagens e bancos diversos, o que dificulta sua utilização pelos diferentes agentes sociais. Da mesma forma, sugere-se também acesso às bases de dados completas de forma a facilitar a análise e utilização dos dados disponíveis.
Já com relação à linha de ação 3.2.1 (Fortalecer e ampliar a oferta de assistência técnica por meio de entidades executoras de Ater, assegurando o atendimento inclusivo e a incorporação de modelos de assistência voltados às práticas sustentáveis, à conservação e à redução do desmatamento), sugerimos incluir também a redução dos incêndios entre os objetivos da assistência técnica tratada nessa linha.
Acerca do fortalecimento e ampliação de direitos e garantias de acesso aos recursos naturais proposto pelo resultado esperado 3.3, ainda que o Plano considere a centralidade dessa agenda tanto para as organizações sociais de trabalhadores e trabalhadoras extrativistas quanto como estratégia de conservação e inclusão social, a linha de ação prevista (3.3.1) não estabelece com clareza como será ampliado o acesso de agricultores familiares extrativistas aos recursos naturais necessários à segurança alimentar e à renda familiar. Sugerimos, por exemplo, que sejam previstas ações relacionadas a: regularização dos territórios tradicionais, criação de mecanismos de gestão participativa, apoio aos coletivos, redes e fóruns agroextrativistas, mecanismos de certificação participativa, apoio e incentivo para o uso da Reserva legal das propriedades particulares para o aproveitamento de frutos por parte dos agroextrativistas, entre outros. Da mesma forma, é importante considerar como será fortalecido e ampliado o acesso a mercados para escoamento das produções de agricultores familiares extrativistas para além dos programas de compras governamentais.
Além disso, o texto do plano (página 44) faz menção equivocadamente à linha de ação que prevê a ampliação do acesso de agricultores familiares extrativistas aos recursos naturais como a linha 1.5.1, quando a linha de ação correta é a que tratamos acima, a 3.3.1.
Por fim, a Coalizão propõe que seja considerado no Eixo I um quarto objetivo relacionado à articulação com outros entes federativos especificamente para ações de fomento às atividades produtivas sustentáveis, análogo a um objetivo estabelecido pelo PPCDAm. A articulação com estados, municípios e estruturas de governança, como a Associação Brasileira de Entidades Estaduais de Meio Ambiente e a Associação Nacional de Municípios e Meio Ambiente, é indispensável para fomentar alternativas de geração de renda e emprego sustentáveis, em especial na região do Matopiba, onde encontram-se as maiores taxas de desmatamento do bioma. Da mesma forma, reforçamos a importância do setor privado no fomento e implementação dessas alternativas, motivo pelo qual acreditamos que esta articulação também deve envolver o setor.
Além disso, é importante considerar que vários estados e municípios estão em zonas de transição entre os biomas Cerrado e Amazônia, motivo pelo qual é importante que as estratégias de articulação sejam também implementadas a partir de uma diretriz nacional abrangente.
Detalhamos abaixo a proposta de objetivo e resultado esperado, nos colocando à disposição para construir essa frente de forma colaborativa:
Objetivo 4. Fortalecer a articulação com os entes federativos do bioma Cerrado e com o setor privado nas ações de fomento às atividades sustentáveis
Resultado 4.1. Articulação com os estados e municípios do Cerrado e com o setor privado nas ações de fomento às atividades produtivas sustentáveis fortalecida
ii.2. Coalizão Brasil: Contribuições sobre o Eixo II – Monitoramento e controle ambiental
Objetivo 4. Fortalecer a atuação das instituições federais e garantir a responsabilização por crimes e infrações administrativas ambientais ligados ao desmatamento, à ocorrência de incêndios florestais e à degradação florestal no Cerrado
O objetivo 4 trata do fortalecimento das instituições federais no combate e responsabilização por crimes e infrações administrativas ambientais ligados ao desmatamento, incêndios florestais e degradação florestal no Cerrado.
No que tange aos recursos humanos, tecnológicos e logísticos para enfrentamento dos crimes e ilícitos ambientais, contemplados pela linha de ação 4.1.3, sugerimos que seja incluída na redação da mesma a garantia de segurança das pessoas envolvidas nessas ações.
E como parte das ações de fortalecimento da atuação das instituições federais responsáveis pela investigação e fiscalização propostas no objetivo 4, sugerimos que seja considerada também a integração, ordenamento e interoperabilidade das bases de dados federais, conforme recomendamos especificamente em relação ao objetivo 7.
Objetivo 5. Aprimorar a capacidade de controle e monitoramento de desmatamentos, incêndios florestais, degradações e cadeias produtivas
O resultado esperado 5.1 trata da capacidade de monitoramento do desmatamento, dos incêndios e da degradação florestal, porém – assim como ocorreu no PPCDAm -, não menciona a importância do monitoramento da vegetação secundária de forma frequente e regular. A Coalizão vem discutindo e buscando aprimorar a integração de dados de monitoramento da regeneração natural, restauração e reflorestamento, a fim de traçar um panorama da recuperação da vegetação nos biomas brasileiros (veja mais sobre o Observatório da Restauração e Reflorestamento aqui). Além disso, há outras iniciativas voltadas ao monitoramento da restauração precisamente no Cerrado, como a Plataforma de Monitoramento da Restauração do Cerrado liderada pela Rede Colaborativa e Multisetorial pela Restauração do Cerrado – ARATICUM. O monitoramento da vegetação secundária é fundamental para acompanhar a efetividade dos Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento (PPCDs) em atingir seu objetivo de desmatamento zero – considerado como a manutenção ou incremento da área de vegetação nativa no nível do bioma. Dessa forma, propõe-se que o PPCerrado esclareça qual será a ferramenta e o processo de monitoramento da vegetação secundária que irá contribuir especialmente para os objetivos 1 e 5 do plano.
Conforme já mencionado em referência ao objetivo 2, a Coalizão notou com preocupação a ausência de objetivos estratégicos, resultados e linhas de ação voltadas especificamente à rastreabilidade para o controle de origem da carne, grãos e outros produtos agropecuários, fundamental para atingir a meta de desmatamento zero e de reduções de emissões estabelecida pelo governo, além do atendimento a demandas e normas comerciais pela indústria nacional, em especial da União Europeia, que recentemente estabeleceu legislação proibindo a importação de produtos provenientes de áreas desmatadas.
Nesse sentido, a Coalizão acredita que o Brasil deve estabelecer um marco legal sobre rastreabilidade e transparência, que abranja a complexidade das cadeias de commodities para fins de monitoramento e controle socioambiental. Trata-se da construção de um sistema nacional público, oficial e integrado, visto que não há uma metodologia única vigorando sobre as iniciativas de rastreabilidade já existentes. As iniciativas privadas existentes e isoladas não apresentam uma estratégia eficaz e não respondem proativamente às demandas por transparência. Precisamos encontrar consensos entre todos os atores envolvidos neste diálogo: poder público, setor agropecuário, sociedade civil e academia.
A linha de ação 5.1.1 faz menção ao monitoramento das cadeias produtivas. Porém, a Coalizão propõe que este tema seja abordado de maneira mais robusta no objetivo estratégico 5, de forma a estabelecer uma estratégia para garantir a origem legal dos produtos agropecuários, através de resultados esperados e linhas de ação específicas, com prazos e atores responsáveis.
Proposta para resultado esperado e linha de ação:
5.3. Monitoramento, rastreabilidade e transparência das cadeias produtivas agropecuárias aprimorados
5.3.1. Elaborar e implementar o Sistema Nacional de Monitoramento e Controle da Origem dos Produtos Agropecuários integrado ao SICAR, Sinaflor e aos cadastros fundiários
Reforçamos a importância da integração entre o SICAR, o Sinaflor, os cadastros fundiários, de forma a garantir a adequação e correspondência das áreas declaradas no CAR com o perímetro e formato do imóvel junto aos cadastros fundiários (SIGEF, SNCR, CNIR, entre outros). O sistema de monitoramento da origem dos produtos agropecuários deve incorporar ainda a área total do imóvel, garantindo que não haja desmatamento em sua totalidade, e não apenas na área contratada pela empresa ou plantada com commodities específicas. A integração com outros sistemas de dados, como o Sinaflor, GTA e outros também deveriam ser integrados de forma a permitir a rastreabilidade e monitoramento ao longo de toda a cadeia de suprimentos. Da mesma forma, deve – ainda que de forma gradual/faseada e inicialmente em áreas prioritárias – garantir a origem e rastreabilidade da produção, sendo de cada indivíduo, no caso da pecuária.
Recomendamos que o sistema que propomos seja construído de forma participativa a partir de experiências e iniciativas já existentes, desenvolvidas tanto pelo setor público, a exemplo das Guias de Trânsito Animal, SISBOV e do Naturatins (no estado do Tocantins), como aquelas desenvolvidas pelo setor privado, como a Mesa Redonda da Soja Responsável – RTRS, Mesa Brasileira da Pecuária Sustentável, Boi na Linha, Soja na Linha, o Protocolo de Monitoramento Voluntário de Fornecedores de Gado no Cerrado (Protocolo do Cerrado), Grupo de Trabalho dos Fornecedores Indiretos – GTFI, entre outras.
É fundamental também que o sistema preveja transparência ativa, garantindo assim que os elos da cadeia e atores sociais interessados tenham oportunidade de realizar consultas individuais ou automatizadas via integração com outros sistemas e ferramentas. Para tanto, é necessário que as bases completas sejam públicas e acessíveis, com respeito à Lei Geral de Proteção de Dados (Lei 13.709/2018).
A Coalizão publicou, em 2021, o estudo “Rastreabilidade da Cadeia da Carne Bovina no Brasil: Desafios e Oportunidades”, que analisa o estado da arte da cadeia da carne bovina, iniciativas de monitoramento e rastreabilidade, os riscos e oportunidades e traz recomendações especificamente para a rastreabilidade nesta cadeia. Adicionalmente, desde o final de 2022, a Força-Tarefa de Rastreabildiade e Transparência da Coalizão vem se dedicando a promover debates e alinhamentos setoriais para contribuição para um sistema nacional de rastreabilidade e transparência que possa lidar com a complexidade das cadeias produtivas. O principal objetivo do grupo é contribuir para o desenvolvimento de um sistema/política de rastreabilidade para produtos agrícolas.
Objetivo 6. Implementar o Manejo Integrado do Fogo
O Objetivo 6 trata da implementação do manejo integrado do fogo, buscando contribuir para a redução dos incêndios florestais no bioma, a que se refere também o resultado esperado 6.1. A Coalizão entende que, para que tal resultado seja atingido, é importante promover a articulação e cooperação entre os diferentes atores sociais, visando a implementação do manejo do fogo. Sugerimos a inclusão de uma linha de ação com este recorte como parte deste resultado:
6.1.3. Promover a articulação entre os entes federativos e diferentes atores sociais, visando a implementação do Manejo Integrado do Fogo.
Objetivo 7. Avançar no controle e na regularização ambiental com o aprimoramento e a integração de dados do Sistema Nacional de Controle da Origem dos Produtos Florestais (Sinaflor) e do Sistema Nacional de Cadastro Ambiental Rural, de embargos e de outras soluções
O Plano de Ação trata em seu objetivo 7 do avanço no controle e na regularização ambiental com o aprimoramento e integração de dados do Sistema Nacional de Controle da Origem dos Produtos Florestais (Sinaflor), do Sistema Nacional de Cadastro Ambiental Rural (Sicar), e embargos. Para além da integração destes sistemas e bases de dados, que a Coalizão entende como necessário, reforçamos que é também primordial que sua operação esteja alinhada e integrada com os cadastros fundiários, como Sistema de Gestão Fundiária (SIGEF), o Cadastro Nacional de Imóveis Rurais (CNIR) e o Sistema Nacional de Cadastro Rural (SNCR), de maneira a garantir a regularidade ambiental e fundiária num mesmo esforço. Essa ação também é fundamental para fortalecimento da rastreabilidade das cadeias produtivas, proposta pela Coalizão no Objetivo 5.
Desta forma, sugerimos que seja explicitado no texto do objetivo 7 a integração com estes outros sistemas e incluída a seguinte linha de ação:
7.1.4. Integração dos dados do SICAR e Sinaflor aos dados dos cadastros fundiários (SIGEF, CNIR, SNCR, e outros)
Além disso, a Coalizão entende que a análise e validação do CAR, citada na página 47 do documento, é mais do que uma etapa importante para promover a regularização ambiental e reinserção produtiva a que se refere a linha de ação 2.1.2, é fundamental para tanto. Reforçamos também que este instrumento vem sendo utilizado como ferramenta de monitoramento nas cadeias produtivas e portanto dar celeridade na análise e validação do CAR, em articulação com os estados, é uma necessidade premente.
Objetivo 8. Fortalecer a articulação com os estados do Cerrado a fim de promover ações estruturantes para o controle de desmatamentos e incêndios florestais
O objetivo 8 busca fortalecer o trabalho conjunto entre a União e os estados do Cerrado para, através de ações estruturantes, obter melhores resultados no controle de desmatamentos e incêndios florestais, através dos Planos Estaduais de Prevenção e Controle do Desmatamento e Queimadas – PPCDQs (8.1.1) e de ações com objetivo de apoiar a realização de campanhas de sensibilização e capacitações relacionadas à prevenção e ao controle de desmatamentos e incêndios (8.1.2).
Enaltecemos a inclusão deste objetivo, seu resultado esperado e linhas de ação. Considerando as dinâmicas de desmatamento e incêndios florestais no bioma, e o fato de que as áreas privadas concentram a maior parcela do desmatamento no Cerrado, inclusive com autorização de estados e municípios (ainda que parte dessas sejam decorrentes de irregularidades), é mesmo imprescindível que haja engajamento e coordenação junto aos estados para alcance dos objetivos estabelecidos, inclusive para que estes avancem em suas análises do Cadastro Ambiental Rural, conforme já mencionado. Contudo, é preciso que a articulação se dê também na esfera municipal, aqueles que têm mais informação e capacidade de ação local na prevenção e controle do desmatamento e incêndios florestais. Por isso, primeiramente sugerimos que o objetivo 8 faça referência aos “entes federativos”, ampliando o escopo da articulação com os estados também para os municípios. Nesse sentido, sugerimos que seja estabelecido – através de uma nova linha de ação – um programa de capacitação e assistência aos municípios para fortalecer as capacidades técnicas dos municípios para que possam contribuir no alcance dessa diretriz. Tal programa poderia ser realizado em parceria com a Associação Nacional de Municípios e Meio Ambiente (ANAMMA), de maneira a contornar as dificuldades de articulação município a município.
Ainda em referência ao objetivo 8, o texto do Plano menciona diversos encontros e a formação de um grupo de trabalho entre o MMA e a Associação Brasileira de Entidades Estaduais de Meio Ambiente (Abema), que apresentou ao ministério propostas de medidas de curto e médio prazo para redução do desmatamento ilegal no bioma, além de reuniões específicas com os estados que formam o Matopiba. Sugerimos que seja previsto como parte do PPCerrado um sistema de governança que integre, além dos estados, a esfera municipal, cuja importância já foi citada anteriormente, o setor privado, instituições de ensino e pesquisa e as organizações da sociedade civil, garantindo assim a sua participação nas discussões que vêm ocorrendo no âmbito do Grupo de Trabalho instituído e contribuição na implementação e acompanhamento das propostas e ações a serem implementadas.
ii.3. Coalizão Brasil: Contribuições sobre o Eixo III – Ordenamento fundiário e territorial
Objetivo 9. Garantir a destinação de terras públicas para proteção, conservação e uso sustentável dos recursos naturais, especialmente para povos indígenas, comunidades quilombolas, outros povos e comunidades tradicionais e agricultores familiares
Com relação ao objetivo 9 e especificamente seu resultado esperado 9.1, que visa destinar terras públicas e reduzir a insegurança fundiária, primeiramente celebramos a recente retomada da Câmara Técnica de Destinação e Regularização Fundiária de Terras Públicas Federais Rurais, buscando ampliar a destinação de terras, priorizar políticas públicas de conservação ambiental e o uso social da terra, e estabelecendo caráter deliberativo às decisões tomadas pela instância sobre a destinação de terras públicas, através da participação de diferentes Ministérios e outros órgãos federais como INCRA, SPU, ICMBio, Serviço Florestal Brasileiro e FUNAI.
Ressaltamos, contudo, que tal reestruturação precisa garantir a participação ativa da sociedade civil junto à Câmara – o que pode ocorrer com um assento oficial no órgão ou por meio de processos de escuta aos representantes em eventos e seminários oficiais (a exemplo do Seminário Técnico-Científico de Análise de Dados do Desmatamento na Amazônia), de forma a compilar os posicionamentos e considerá-los no momento da deliberação.
Sabe-se que, apesar da predominância de áreas privadas, o bioma Cerrado possui pelo menos 7,13 milhões de hectares de terras públicas ainda não destinadas, além das terras públicas estaduais cujas informações não estão consolidadas.
A Coalizão entende que a destinação de terras públicas é uma questão urgente, portanto sugerimos que a Câmara Técnica de Destinação e Regularização Fundiária de Terras Públicas Federais Rurais estabeleça um cronograma de ação, de forma alinhada com o PPCerrado, definindo metas e prazos para destinação dessas terras, assim como a provisão de recursos necessários para tanto. Sabe-se da complexidade jurídica e das dificuldades relacionadas ao custeio dos processos de destinação e regularização fundiária, por isso consideramos que o estabelecimento deste cronograma tem importância substancial para o alcance do resultado esperado 9.1, no âmbito do PPCerrado.
No que se refere à destinação das terras públicas estaduais e municipais, seria de suma relevância a criação de espaços de governança análogos à Câmara Técnica de Destinação e Regularização Fundiária de Terras Públicas Federais Rurais nessas esferas, prevendo, vale reforçar novamente, a participação dos diferentes atores da sociedade. Nesse sentido, sugerimos que o governo federal auxilie esses outros entes federativos, em especial os estados, a estabelecer suas Câmaras Técnicas estaduais de destinação e regularização de terras públicas.
Objetivo 10. Ampliar e fortalecer a gestão das áreas protegidas
O objetivo 10 trata da ampliação e fortalecimento da gestão de áreas protegidas. Atualmente, apenas 12,7% do território do bioma está em áreas protegidas, entre Unidades de Conservação, Territórios Indígenas, Quilombolas e outros territórios de comunidades tradicionais. Esse percentual encontra-se ainda bastante distante dos compromissos acordados no Pacto Global da Biodiversidade e nas metas de Montreal-Kunming, entre as quais a proteção de 30% das áreas terrestres e das águas. Assim, propomos inicialmente que o Plano apresente metas compatíveis com os acordos globais citados e como as mesmas serão implementadas.
Nesse sentido, sugerimos primeiramente que a alteração do enunciado do objetivo 10 para “Ampliar e fortalecer o sistema e a gestão de áreas protegidas”, de maneira a expressar a importância da ampliação de áreas sob proteção e do fortalecimento da gestão das mesmas.
Com relação a este objetivo, entendemos que é fundamental a criação de um mosaico de áreas protegidas, inclusive com cinturões para conectividade dessas áreas, garantindo que desempenhem um papel relevante em conter o desmatamento, a exemplo do que já é realizado na Amazônia, através do Programa Áreas Protegidas da Amazônia – ARPA. Para tanto, devem ser considerados instrumentos de planejamento territorial, como o Zoneamento Ecológico Econômico e outros, e previstas não somente as Unidades de Conservação (resultado esperado 10.1) de Proteção Integral e Uso Sustentável, mas também as Terras Indígenas, Territórios Quilombolas e de Povos e Comunidades Tradicionais (resultado esperado 10.2), e demais territórios de relevância socioambiental em sintonia com a promoção e fortalecimento da sociobioeconomia tratados no objetivo 1.
Novamente, vale reforçar novamente a importância da integração de bases de dados federais, sua integração e harmonização com bases de dados estaduais e da transparência ativa facilitada.
Com relação especificamente à linha de ação 10.2.3, que se refere a planos de gestão territorial e ambiental de Terras Indígenas, Territórios Quilombolas e Territórios de Povos e Comunidades Tradicionais, é importante que as ações de fomento tecnológico e econômico e assistência técnica previstas sejam especializadas e direcionadas especificamente a esses públicos.
Para as revisões do zoneamento ecológico-econômico (ZEE), zoneamento agroecológico (ZAE) e zoneamento agrícola de risco climático (ZARC) e outras ações previstas entre as linhas de ação do resultado 10.3, devem ser consideradas as áreas e ações prioritárias para a sua conservação, tendo em vista o estabelecimento e ampliação de áreas protegidas. Assim, sugere-se a alteração do texto, incluindo nas redações do resultado e de suas respectivas linhas de ação: “considerando áreas e ações prioritárias para conservação do Cerrado”.
Objetivo 11. Coordenar e/ou alinhar o planejamento dos grandes empreendimentos e projetos de infraestrutura com a meta de desmatamento zero até 2030
O objetivo 11 trata da coordenação e alinhamento entre os grandes empreendimentos e projetos de infraestrutura a serem construídos no âmbito do novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) na região com a meta de desmatamento zero até 2030. Reforçamos a necessidade de que os Estudos e instrumentos previstos nas linhas de ação deste objetivo considerem e estejam alinhados também com os produtos das linhas de ação 10.3.1, 10.3.2, 10.3.3, 10.3.4 e 10.3.5, de maneira a garantir que além do controle do desmatamento sejam consideradas as áreas prioritárias para conservação e recuperação da vegetação nativa, em linha com a meta de desmatamento zero adotada pelo governo.
A linha de ação 11.1.3 trata da regulamentação e implementação da Avaliação Ambiental Estratégica como instrumento de planejamento, com foco em grandes empreendimentos e projetos de infraestrutura. A esse respeito, primeiramente sugerimos que sejam considerados todos os empreendimentos com potencial de impacto ambiental, substituindo assim, o termo “grandes empreendimentos”. Também reforçamos a importância de que a regulamentação do instrumento citado seja convergente com a meta de desmatamento zero até 2030 e leve em consideração fatores como a expansão da fronteira agropecuária na região do Matopiba e a conservação do Cerrado em extensão que garanta a capacidade de suporte hídrico, climático e de biodiversidade.
ii.4. Coalizão Brasil: Contribuições sobre o Eixo IV – Instrumentos normativos e econômicos
Com relação ao eixo IV, lembramos que a Coalizão apresentou propostas para o Plano Safra 2023/2024, debatidas e endossadas pela Força-Tarefa de Finanças Verdes, e enviadas à Secretaria de Política Agrícola do Ministério da Agricultura e Pecuária. Grande parte das contribuições trazidas para este eixo se baseiam nessas propostas.
Objetivo 12. Criar, aperfeiçoar e implementar instrumentos normativos e econômicos para controle do desmatamento
Com relação à linha de ação 12.3.3, esta prevê a ampliação do acesso a capitais e mercados para cooperativas e associações de pequenos produtores, mencionando o aperfeiçoamento e ampliação dos repasses do Fundo Constitucional do Centro-Oeste (FCO). Primeiramente, consideramos necessário abranger uma gama mais ampla de produtores no âmbito desta linha de ação, além de considerar os agricultores familiares, em linha com o estabelecido na Política Nacional da Agricultura Familiar e Empreendimentos Familiares Rurais (Lei 11.326/2006). Além disso, considerando a abrangência do bioma sobre outras regiões geográficas do país, recomendamos a menção também ao Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste (FNE) e ao Fundo Constitucional de Financiamento do Norte (FNO). Assim, sugerimos que o texto desta linha de ação seja alterado para:
12.3.3. Ampliar o acesso a capitais e mercados para agricultores familiares, pequenos e médios produtores de alimentos e demais produtos oriundos de espécies nativas do Cerrado, incluindo cooperativas e associações, inclusive considerando o aperfeiçoamento dos mecanismos e ampliação dos repasses provenientes do Fundo Constitucional do Centro-Oeste, do Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste (FNE) e do Fundo Constitucional de Financiamento do Norte (FNO).
Também sugerimos a inclusão das seguintes linhas de ação sob o resultado esperado 12.3 Incentivos fiscais, subvenções e financiamento para atividades produtivas e negócios sustentáveis da biodiversidade criados e implementados:
12.3.4. Desenvolver instrumentos financeiros para alavancar o financiamento privado para atividades produtivas sustentáveis (tal como como fundos garantidores de crédito)
12.3.5. Revisar e orientar os incentivos da política agrícola de crédito rural e instrumentos de gestão de riscos (como seguro de renda) para a bioeconomia, sociobiodiversidade e transição agroecológica
12.3.6. Promover incentivos econômicos para a conservação da vegetação remanescente, cadeia da restauração e recomposição da vegetação nativa
12.3.7. Desenvolver e implementar incentivos e fundos específicos para produtos da sociobiodiversidade, promovendo qualidade dos produtos, produção em si, marketing, mercado e conscientização da população.
Com relação ao aprimoramento das políticas de crédito rural (resultado esperado 12.4.), novamente reforça-se a necessidade da menção dos outros Fundos Constitucionais (FNE e FNO) no enunciado do da linha de ação 12.4.3, que faz menção ao Fundo Constitucional de Financiamento do Centro-Oeste. Também sugerimos, no âmbito deste resultado esperado, a inclusão das seguintes linhas de ação:
12.4.5. Estimular a criação ou a expansão de mecanismos de financiamento públicos e/ou privados e mobilizar capital de blended finance para ampliar o alcance da implementação das SPSabc do Plano ABC+, a regularização ambiental conforme o Código Florestal e seus mecanismos de compensação ambiental no Cerrado.
12.4.6. Exigir a observância do Zoneamento Agrícola de Risco Climático – ZARC em todas as operações de crédito rural da Política Nacional de Crédito Rural e incentivar a contratação de instrumentos de gestão de riscos climáticos.
12.4.7. Exigir a comprovação da qualidade das pastagens para os financiamentos de investimento do Pronaf, Pronamp, Moderagro e financiamentos sem vínculo a programa específico para aquisição de bovinos e, caso exista algum grau de degradação das pastagens, o financiamento deve ser feito em conjunto com a recuperação das pastagens degradadas, enquadrado em algum dos subprogramas do Programa ABC+ (pequenos e médios produtores rurais) e na linha de crédito de investimento do Pronaf ABC+ Bioeconomia (agricultura familiar).
12.4.8. Aprimorar a gestão integrada de riscos ambientais e climáticos no SICOR: incorporar a verificação do desmatamento do PRODES/INPE, disponibilizar mapas de qualidade das pastagens (LAPIG, Embrapa), mapa com o potencial hídrico para irrigação disponibilizado no Atlas de Irrigação da Agência Nacional de Águas, mapas do ZARC com os quatro Níveis de Manejo (ZARC NM), assim como as bases de dados necessárias para coleta de informações junto ao produtor rural e estratégias de coleta de dados e monitoramento.
12.4.9. Tornar obrigatório o preenchimento de campos já disponíveis no SICOR nas operações de crédito rural, de forma a aprimorar a subscrição dos riscos e a sustentabilidade da propriedade rural considerando os incentivos criados no Plano Safra 2022/23.
12.4.10. Aprimorar a gestão integrada de riscos da agropecuária, orientando os incentivos e subsídios das políticas de gestão de riscos (PROAGRO, PSR – Programa de Subvenção ao Prêmio do Seguro Rural, Garantia Safra) para práticas produtivas sustentáveis e incentivar a subscrição de riscos ambientais, climáticos e sociais nestes instrumentos.
12.4.11. Desenvolver um Plano de Implementação do ZARC Níveis de Manejo – ZARC NM junto às seguradoras para subscrição dos riscos ambientais e climáticos de acordo com o nível de manejo adotado
12.4.12. Garantir que recursos dos Fundos Constitucionais de Financiamento (FCO, FNE, FNO) tenham os mesmos requisitos e incentivos dos programas de financiamento do Sistema Nacional de Crédito Rural para harmonizar e simplificar o crédito rural, assim como alocar recursos dos Fundos Constitucionais no financiamento de práticas produtivas sustentáveis e na transição tecnológica alinhadas ao Plano ABC+ e ao Código Florestal.
12.4.13. Compatibilizar os objetivos das linhas de crédito do Plano Safra às bases conceituais do Plano ABC+ relacionados à resiliência climática e à Abordagem Integrada da Paisagem (AIP).
12.4.14. Incentivar os bancos cooperativos, cooperativas de crédito e demais instituições bancárias a operarem nas regiões do Cerrado com menor oferta de instituições financeiras (especialmente no Matopiba).
12.4.15. Desenvolver instrumentos financeiros para alavancar o financiamento privado para atividades produtivas sustentáveis (tal como como fundos garantidores de crédito, securitização de carteiras de crédito etc.)
12.4.16. Expandir o atual marco regulatório para incluir o impedimento da concessão de crédito em imóveis com desmatamento posterior a 2008 que não tenha obtido autorização de supressão de vegetação ou outras infrações ambientais, a menos que o produtor comprove a regularização deste passivo por meio de adesão ao PRA ou instrumento semelhante.
12.4.17. Impedir o crédito rural em áreas que estejam sob conflito ou disputa, especialmente no caso destas envolveram povos indígenas, quilombolas e outros povos e comunidades tradicionais, além dos casos já previstos na Resolução BCB 140.
Também sugerimos a inclusão, sob o resultado 12.6 (Investimentos verdes), da seguinte linha de ação:
12.6.2. Desenvolver instrumentos regulatórios e financeiros para alavancar o financiamento da produção sustentável (como fundos garantidores de crédito).
E finalmente incluir, no âmbito do resultado esperado 12.7 (Iniciativas voluntárias implementadas), a linha de ação:
12.7.2. Facilitar o acesso a bases de dados de domínio público para iniciativas do setor privado relacionadas à rastreabilidade e monitoramento socioambiental de matérias-primas, insumos e produtos agropecuários.