Nº 91
07/2024

Tempo de leitura: 8 minutos

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Representantes de diferentes setores discutem visão de clima e biodiversidade

Painel realizado em plenária da Coalizão abordou financiamento, bioeconomia e mercado de carbono como saída ao modelo econômico tradicional

Na segunda parte da 1ª Plenária do ano da Coalizão Brasil, aconteceu o painel “Do clima à biodiversidade: uma visão brasileira no palco global”, que teve como participantes Fabíola Zerbini, diretora do Departamento de Florestas do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA); Luciana Gatti, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe); Marcelo Medeiros, cofundador da Lanx Capital Investimentos; e de Rodrigo Lima, sócio-diretor da Agroicone. 

O debate contou com a mediação de Renata Piazzon, cofacilitadora da Coalizão e diretora-geral do Instituto Arapyaú, e girou em torno das oportunidades e desafios para o Brasil na agenda agroambiental diante de eventos como o G20 e a COP 29 e qual o papel de cada setor – público, privado, financeiro e academia.

Fotos: María Isabel Oliveira

1ª Plenária da Coalizão em 2024, realizada no dia 4 de julho, reuniu cerca de 80 pessoas em São Paulo.
A gerente-executiva Carolle Alarcon apresentou um balanço sobre as atividades da rede no primeiro semestre do ano.
Os cofacilitadores Fernando Sampaio e Renata Piazzon apresentaram, respectivamente, um painel com líderes de forças-tarefa e um debate sobre a agenda internacional.
Público acompanha painel com líderes de forças-tarefa.
Painel de líderes: da esquerda para a direita, Gabriela Savian (FT Mercados de Carbono), Juliana Lopes (FT Bioeconomia), Mariana Pereira (FT Segurança Alimentar), Isabella Freire (FT Rastreabilidade e Transparência) e Ligia Dutra (FT Código Florestal).
A cofacilitadora Renata Piazzon foi moderadora de painel sobre oportunidades para o Brasil nas agendas de clima e biodiversidade.
Fabíola Zerbini, diretora do Departamento de Florestas do Ministério do Meio Ambiente, apresentou compromissos do governo federal com a restauração florestal.
Luciana Gatti (à direita), pesquisadora do Inpe, alertou sobre efeitos do desmatamento na Amazônia.
Marcelo Medeiros (à esquerda), da Lanx Capital Investimentos, comentou papel do setor financeiro junto à agenda internacional do país para clima e biodiversidade.
Os participantes do painel da plenária: Marcelo Medeiros (Lanx Capital), Luciana Gatti (Inpe), Renata Piazzon (Coalizão), Fabíola Zerbini (Ministério do Meio Ambiente) e Rodrigo Lima (Agroicone).

Veja os principais pontos discutidos. Para assistir ao debate na íntegra, acesse aqui

Financiamento 

Rodrigo Lima, da Agroicone, apontou a falta de recursos para dar conta dos planos, programas e ações em clima, biodiversidade e bioeconomia. “O Brasil deve aproveitar foros como o G20 para canalizar a diversificação de fontes de receita e de financiamento que realmente cheguem às ações climáticas necessárias. Sem isso e sem trazer o setor privado para contribuir, não será possível”, explicou. 

“O principal papel no financiamento é dos bancos”, acrescentou Marcelo Medeiros, da Lanx Capital Investimentos. “E eles devem prestar contas sobre o que financiaram em termos verdes, mostrando que não destinaram recursos para projetos que envolvem desmatamento na Amazônia.” 

Criação de mercado global de carbono

Medeiros defendeu uma regulamentação global do mercado de carbono com valor único para transação da tonelada. Caso contrário, alertou, haverá fuga das indústrias para países onde esse custo seja menor. 

“Emitir uma tonelada de carbono na atmosfera no Brasil ou em qualquer outro lugar do mundo tem o mesmo efeito no planeta. Da mesma forma, tem impacto positivo a retirada dessa tonelada da atmosfera”, destacou. 

Segundo ele, o Brasil tem uma grande oportunidade para estancar suas emissões: cessar o desmatamento e promover o uso de técnicas mais modernas na agricultura, com menor emissão e maior captura de carbono: “São duas coisas facílimas para se fazer e reduzir essas emissões. Dessa forma, o Brasil poderia liderar a agenda climática e de mercado de carbono no mundo.”

Tendo uma emissão per capita considerada na média, em relação aos demais países do mundo, o Brasil tem condições de ser protagonista na defesa de um mercado global de carbono, com regras e preço único na tonelada de carbono, acrescentou Medeiros. “Quem emite acima da média, compensaria financeiramente os países que emitem abaixo dessa média. O Brasil, a princípio, não receberia nem pagaria. Mas, diminuindo suas emissões, também passaria a receber.”

Liderar pelo exemplo

Fabíola Zerbini afirmou que a principal orientação do governo federal é de que o país lidere a agenda climática e ambiental pelo exemplo. E ressalta que, para isso, é necessário haver lastro. “Por isso, o Planava, PPCDAm, os planos para os outros biomas e o Plano de Transformação Ecológica não devem reinventar nada. O papel deles é repactuar politicamente instrumentos e instituições com papeis diversos que, juntos, farão as metas relacionadas ao clima acontecer”, disse. 

Para ela, a conta a ser feita não é apenas do valor a ser financiado, mas o custo das externalidades negativas, como do desmatamento. “Também incluímos nas contas, que são complexas, o impacto fiscal do Plano de Transformação Ecológica”, explicou. 

Floresta em pé beneficia o agro

Luciana Gatti, do Inpe, trouxe dados alarmantes de sua pesquisa. Segundo ela, nos últimos quatro anos, a floresta amazônica deixou de retirar CO2 da atmosfera e tornou-se emissora, indicando que já não é mais um ecossistema saudável. 

“Reduzimos o desmatamento, mas ele continua significativo, já que saímos de patamares altíssimos. Em 2020, foram cortadas 24 árvores por segundo no Brasil”, disse. “A floresta já não consegue garantir o regime de chuvas e o controle da temperatura e está lançando mais CO2 na atmosfera, acelerando ainda mais as mudanças climáticas e prejudicando o agro.”

No atual cenário, de acordo com Gatti, o desmatamento zero já não será o bastante para o país. A saída é promover a silvicultura de espécies nativas. “Precisamos recuperar a floresta perdida. Haverá geração de emprego e renda e teremos nossa proteção climática de volta”, afirmou ela. 

Medeiros, da Lanx, também seguiu na defesa da restauração com espécies nativas como uma das duas atividades com viabilidade econômica em alta escala, com custo de captura abaixo de US$ 100 e bom resultado na captura de carbono – “só a floresta em lote estoca carbono”. A outra é o plantio de cana para produção de etanol. 

Bioeconomia é saída econômica

A silvicultura de nativas também pode contribuir para aumentar a produção agropecuária. Gatti lembrou que o cacau cultivado em sistema agroflorestal apresenta uma taxa de produtividade três vezes maior do que no modelo de monocultura e não demanda fertilizantes ou defensivos agrícolas. 

“A ciência já desenvolveu técnicas para que a floresta seja mais produtiva por meio de agrofloresta e da bioeconomia. Precisamos juntar setores, unir saberes e compartilhar conhecimento entre os produtores”, defendeu. 

Lima, da Agroicone, reforçou ainda que a produção em larga escala – seja de produtos da sociobiodiversidade comprados por grandes companhias, seja a produção agropecuária de grandes propriedades – está bem resolvida e com acesso a crédito e assistência técnica e extensão rural (ATER). No entanto, ponderou que é preciso impulsionar os pequenos produtores e a agricultura familiar: “O desafio para mim são os pequenos produtores, com baixo acesso a crédito, a ATER e ao mercado para venda de produtos.” 

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