Nº 83
11/2023

Tempo de leitura: 9 minutos

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COP 28 gera expectativas sobre papel do Brasil e futura conferência em Belém

Lideranças comentam os temas que devem ganhar destaque no encontro internacional e o que país tem a apresentar ao mundo

Foto: Flickr/COP28UAE

O Brasil chegará à Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP 28), em Dubai, com dados positivos a apresentar e com contribuições para os temas que devem ganhar os holofotes. Apesar de não ter finalizado a regulação de seu mercado de carbono e de enfrentar pressões para definir se permitirá ou não a exploração de petróleo na Margem Equatorial, há conquistas para mostrar à comunidade internacional, como a queda da taxa de desmatamento na Amazônia.

“Estamos com um índice de desmatamento menor e organizamos neste ano a Cúpula dos Países Amazônicos com grande visibilidade internacional, nos colocando como um país que busca soluções na questão florestal”, analisa Suzana Kahn, membro do Grupo Estratégico (GE) da Coalizão Brasil e diretora da Coppe/UFRJ.

De acordo com lideranças da Coalizão, a lista de temas que devem ganhar destaque na COP abrange a agenda de sistemas alimentares e da agricultura de baixo carbono; o fundo de perdas e danos – que poderia impulsionar o financiamento climático a países menos desenvolvidos – e a possibilidade de anúncios de metas (NDCs) mais ambiciosas para a redução das emissões de gases de efeito estufa.

Na terça-feira, 14 de novembro, a UNFCCC, painel climático da ONU, anunciou que as atuais metas nacionais, que têm caráter voluntário, são insuficientes para limitar o aumento da temperatura global a 1,5 grau Celsius, como reivindica o Acordo de Paris e a comunidade científica. De acordo com o relatório Global Stocktake, divulgado pela organização, os países precisarão acrescentar “muito mais medidas” para evitar os “piores impactos da crise climática”.

“A COP será muito marcada pelo balanço dos compromissos já anunciados por cada país. Trata-se de uma avaliação coletiva que precisará elevar o tom do debate em torno da ambição climática”, avalia Renata Piazzon, cofacilitadora da Coalizão e diretora-geral do Instituto Arapyaú.

O Brasil, para especialistas da Coalizão, prepara a COP 28 como uma vitrine para a trigésima edição do evento, que ocorrerá em 2025 em Belém e deverá focar em itens sensíveis da agenda de contenção às mudanças climáticas.

“A COP 30 será a mais importante desde a criação do Acordo de Paris, que completará 10 anos na ocasião. Sua realização no Brasil trará a possibilidade de o país se consolidar como uma liderança na gestão da crise climática”, analisa Karen Oliveira, membro do Grupo Executivo (GE) da Coalizão e diretora de Políticas Públicas e Relações Governamentais da The Nature Conservancy Brasil.

Saiba mais sobre os principais temas que devem marcar a COP 28, em Dubai.

NDCs e Global Stocktake
A divulgação do Global Stocktake, primeiro balanço das emissões globais desde a criação do Acordo de Paris, em 2015, colocará sobre a mesa de negociações a exigência de que os países assumam compromissos mais ambiciosos.

Os dados mais recentes do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da ONU indicam que as emissões de gases de efeito estufa (GEE) precisam ser reduzidas em 43% até 2030, em comparação com os níveis de 2019. Isso é fundamental para limitar o aumento da temperatura a 1,5 grau Celsius até ao final deste século e evitar o agravamento de eventos extremos climáticos, como secas, ondas de calor e precipitações mais frequentes e acentuadas.

No final de outubro, o Brasil apresentou a atualização de sua NDC, retomando os números absolutos de 2015, tendo como ano-base 2005 – redução de 48% de emissões de GEE até 2025 e de 53% até 2030.

“Esse retorno aos números de 2015 demonstram o esforço do governo brasileiro. Porém, para manter viva a meta de limitar o aquecimento global a 1,5 grau Celsius até 2100, novas metas abaixo do patamar apresentado devem ser propostas, considerando números e dados mais recentes, assim como estabelecer uma estratégia de longo prazo, acelerando a transição para uma economia de baixo carbono”, diz Oliveira.  

Fundo de perdas e danos
Considerada uma importante conquista da COP 27, em Sharm El-Sheikh, trata-se de um dispositivo criado com o objetivo de prestar assistência financeira às nações mais impactadas pelos efeitos das mudanças climáticas, em especial países mais pobres.

O fundo é reconhecido como um instrumento importante para a promoção da justiça climática. Espera-se que a COP 28 traga definições sobre seu funcionamento, com base em texto desenvolvido em reuniões técnicas que antecederam a conferência em Dubai.

Mercado de carbono
Em 2021, na COP 26, em Glasgow, aconteceu a esperada regulamentação do Artigo 6 do Acordo de Paris, estabelecendo regras básicas para o funcionamento de instrumentos de mercado de carbono. Isso significa que haverá um ambiente global desse mercado integrado à iniciativa privada, com capacidade para transferência de ativos de descarbonização entre os países signatários do Acordo de Paris. Falta, no entanto, definir regras que garantam transparência e mitiguem riscos de dupla contagem, por exemplo.

No Brasil, um projeto de lei voltado à regulação do Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões (SBCE) foi aprovado em outubro pela Comissão de Meio Ambiente do Senado. O texto, porém, pode ser “fatiado” na Câmara dos Deputados, o que reduziria o impacto das medidas descritas e deve inviabilizar sua divulgação até a COP em Dubai.

A Coalizão emitiu posicionamento favorável à célere aprovação do projeto de lei, sugerindo, no entanto, ajustes para que ele esteja mais alinhado com as particularidades da realidade brasileira. Um dos pontos destacados pelo movimento é que a lei deve “deixar aberto o caminho” para a integração de todos os setores no sistema, incluindo a atividade agropecuária primária.

“Neste primeiro momento, as atividades do agronegócio não devem entrar no mercado de carbono. Isso não significa que não existam oportunidades para a redução de emissões para o setor”, ressalta Marina Grossi, presidente do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS). “Outros instrumentos devem direcioná-lo para ganhos de produtividade com menos emissões, como a ampliação do Programa ABC (Agricultura de Baixo Carbono), sistemas que integram lavouras, pecuária e floresta (ILPF), o fomento à recuperação de pastagens e de áreas degradadas e uma intensificação da pecuária com redução da pegada de carbono.”

Sistemas alimentares
O tema, relacionado à transição da agricultura de baixa emissão de carbono, deverá ganhar ênfase na COP 28. Diversas organizações ambientalistas mundiais atribuem este destaque a uma tentativa dos Emirados Árabes Unidos, uma nação petroleira, de desviar a atenção que seria dedicada ao debate sobre os combustíveis fósseis.

O Brasil traz destaques que podem ser incorporados às discussões sobre sistemas alimentares, como o Plano Safra, o Programa para Financiamento a Sistemas de Produção Agropecuária Sustentáveis (RenovAgro) e o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf).

“A expectativa é que seja anunciado pelo governo o programa de produção sustentável, que prevê a recuperação e conversão de 40 milhões de hectares de pastagens de baixa produtividade em áreas agricultáveis”, revela Oliveira. “A ideia é captar recursos estrangeiros junto aos fundos soberanos e bancos de investimento por meio do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) como garantidor. Os recursos seriam ofertados aos produtores brasileiros com taxas de juros mais competitivas que o crédito convencional.”

Combustíveis fósseis
Ainda há incertezas sobre como o tema será tratado em Dubai. Afinal, o presidente da COP, Sultan Ahmed Al Jaber, é líder da estatal petrolífera dos Emirados Árabes Unidos. Em entrevista ao Financial Times, ele declarou que o setor de combustíveis fósseis deve começar a investir em energia limpa e não pode ser visto como opositor aos esforços de descarbonização. Investir esforços em facilitar a transição energética é um dos eixos citados por Al Jaber como prioritários para a COP 28. 

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